Para além da estética, o botox pode ser usado como uma medicação
A toxina botulínica tem potencial terapêutico, com possível uso em tratamentos neurológicos, de enxaqueca crônica a AVC
KÁTIA ARIMA
A cada quatro meses, a auxiliar administrativa Sônia Figueiredo de Lima, de 38 anos, recebe aplicações de toxina botulínica. O motivo não são rugas ou linhas de expressão, mas as sequelas motoras de um AVC sofrido por ela há 8 anos. “O botox me ajuda a relaxar os músculos. Isso me traz melhor qualidade de vida, pois evita dores e facilita a fisioterapia. Não fico sem”, conta ela, que recebe as injeções em pontos do corpo como sola dos pés, panturrilhas e braços.
Famoso em procedimentos estéticos, o botox é uma das marcas de toxina botulínica, neurotoxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum. Essa toxina bloqueia temporariamente a liberação de uma substância neurotransmissora – a acetilcolina – no músculo. Assim, o cérebro não consegue mandar a informação de volta ao músculo para contrair e ele paralisa. Sem as contrações musculares, a pele fica relaxada e não aparecem vincos e rugas.
MÚLTIPLAS FUNÇÕES. A toxina botulínica tem outras aplicações médicas, menos conhecidas, mas com potencial terapêutico, como é o caso do uso em tratamentos neurológicos. Enxaqueca crônica, bruxismo, hiperidrose (transpiração excessiva), sialorreia (salivação excessiva), sequelas de lesões encefálicas, de AVC, de traumatismo craniano, doença de Parkinson, esclerose múltipla, por exemplo, podem ser enfrentados com aplicações da toxina. “Na mesma lógica dos procedimentos estéticos, a toxina botulínica impede a liberação do neurotransmissor que vai ativar músculos e glândulas. Por isso, é possível bloquear sinais de dor, evitar contrações, excesso de salivação ou transpiração”, explica o neurologista William Rezende, da Beneficência Portuguesa de São Paulo. Segundo ele, as aplicações da toxina podem reduzir, em média, 50% das crises de dor com enxaqueca e 50% da intensidade dessas dores. No caso das dores neuropáticas, é possível reduzir a intensidade de 40% a 50%. “Há pacientes que sofrem de dores com um simples toque de lençol. Esse tipo de caso tem uma melhora ainda maior”, diz.
Em tratamento de enxaqueca crônica com a toxina botulínica há 4 anos, a advogada Tabata Nunciato Previtalli, de 38 anos, sente uma melhora significativa da doença que enfrenta desde que tinha 5 anos. “A enxaqueca sempre atrapalhou a minha vida. Eu vivia no pronto-socorro para receber medicamento na veia, cheguei até a ficar internada. O botox foi um divisor de águas, pois raramente tenho crises que me impossibilitam de trabalhar, ter vida social e fazer minhas atividades normais”, conta. A cada três meses, Tabata recebe injeções em pontos como cabeça, testa, ombros e maxilar. “São sessões tranquilas. Passam anestésico antes da injeção e a agulha é fina”, afirma.
A neurologista Simone Amorim, diretora da Clínica Vita, onde Tabata faz as aplicações, confirma que as aplicações são rápidas. “É um procedimento minimamente invasivo. O profissional vai adequar as injeções de acordo com o tamanho do músculo e da indicação clínica. As doses vão variar para o que quero tratar e onde quero tratar. Após a sessão, você sai e faz as suas atividades normalmente.”
Crianças também se beneficiam da aplicação para enfrentar problemas neurológicos. É o caso de Arthur Delfito Maranho, de 5 anos. Por conta da paralisia cerebral, ele tem espasticidade, um distúrbio caracterizado por músculos tensos ou rígidos que não podem ser controlados. Ele recebe injeções de toxina botulínica há 1 ano, com aplicações a cada três meses. A aplicação na virilha facilita a manipulação dos cuidados na troca de roupas e fraldas, por exemplo. No dedo polegar, a toxina previne o encurtamento no tendão. No ombro, ajuda no posicionamento, já que sem a aplicação ele fica com os ombros muito para trás, por conta da tensão nos músculos do braço. “Sentimos muitas melhoras após o tratamento”, afirma Caroline Delfito Rodrigues, de 28 anos, mãe de Arthur. “Hoje, conseguimos manuseá-lo sem que haja dor e incômodos, dando uma assistência para que ele tenha uma vida feliz. Ele faz as atividades sem ficar irritado, segura lápis e brinquedos nas mãos.”
Outra pessoa que se beneficia desse tipo de tratamento é a comerciante Patrícia Lagar Fresneda, de 40 anos, que faz tratamento há um ano para enfrentar as sequelas de um AVC.
Segundo a neurologista Simone Amorim, o procedimento pode ser feito em ambulatório ou hospital e os efeitos colaterais são raros. Ela explica que um efeito indesejado que pode acontecer no início do tratamento para rigidez muscular é a fraqueza, por conta de uma dose maior que a necessária. “É como uma balança, pois você precisa encontrar uma dose que tire a rigidez na medida certa”, acrescenta a médica. •
Menos dor No caso da dor neuropática, com as aplicações, é possível reduzi-la de 40% a 50%
BEM-ESTAR
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2021-12-04T08:00:00.0000000Z
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