‘Passe livre pode reduzir crise no transporte público do País’
São Caetano do Sul é a cidade mais populosa de São Paulo a adotar o passe livre nas oito linhas do município
DANIELA SARAGIOTTO
Rafael Calabria, do Idec, fala sobre como modelo recém-implantado em São Caetano doSulpodebeneficiarsistema.
No País, 85 municípios já operam dessa forma, o que leva mais passageiros para o sistema de transporte
Desde o dia 1o/11, passou a funcionar, em São Caetano do Sul (SP), a tarifa zero, ou o passe livre, nas oito linhas do transporte público por ônibus. Isso quer dizer que, desde o início do mês, toda a população do município e visitantes podem utilizar os ônibus de graça em seus deslocamentos. Assim, com pouco mais de 165 mil habitantes, de acordo com o IBGE, e 15 km2 de área, São Caetano do Sul passa a ser a terceira cidade da região metropolitana de São Paulo a adotar o modelo, atrás de Vargem Grande Paulista, pioneira ao instituir a gratuidade, em 2019, e de Pirapora do Bom Jesus, em 2020. No entanto, o município é o maior em população no Estado de São Paulo a conceder a tarifa zero. De acordo com a Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul, a projeção é de um investimento de R$ 2,9 milhões por mês para garantir o passe livre à população. Ainda de acordo com a prefeitura, o valor exato será calculado mensalmente, com base em georreferenciamento, e pago diretamente à Viação Padre Eustáquio ( Vipe), concessionária do sistema. O passe livre nos ônibus da cidade pode ser usufruído por todas as pessoas que utilizam o transporte público de São Caetano, inclusive por moradores de outros municípios. Atualmente, de acordo com levantamento da Coalizão Triplo Zero, 85 municípios em todo o Brasil já funcionam com a tarifa zero no transporte público. Para entender mais sobre a medida e como ela impacta a população, conversamos com Rafael Calabria, coordenador de Mobilidade do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). Confira, a seguir.
Em média, quanto os municípios brasileiros que adotam a tarifa zero empenham de seu orçamento?
As cidades que adotam são pequenas e têm, em geral, um transporte de menor qualidade e frequência. Então, não é tão custoso. Mas muitas delas estão trabalhando para melhorar essa frequência, pois há demanda, além de reclamações da população. O que temos visto é que essas prefeituras empenham de 1% a 3%, em média, do orçamento municipal, muitas vezes porque não buscam outras fontes de receita – à exceção de Vargem Grande e Paranaguá, que usaram o Vale Transporte. Normalmente seguem este perfil, mesmo sem termos uma análise bem detalhada: baixa frequência no transporte, com um valor mais baixo.
Que benefícios a medida traz?
Todas as prefeituras que adotaram o passe livre apontam um aumento exponencial no uso do transporte, de quatro ou cinco vezes, ou até mais. Algumas delas mencionaram, também, elevação na arrecadação e no comércio nas regiões centrais pela maior circulação de pessoas. Há, também, o relato de Mariana (MG), onde a população está usando os ônibus para ir até a área central para a venda de seus itens que são produzidos na área rural, gerando, nesse caso, também oportunidades de trabalho. Isso tudo são relatos, porque, no Brasil, ainda não há estudos precisos sobre o impacto da implementação da tarifa zero na redução do uso do carro e da poluição, entre outros efeitos.
Na capital paulista, a tarifa zero pode ajudar a reconquistar passageiros no transporte público?
Em uma cidade grande como São Paulo, a redução da tarifa já traria aumento considerável no número de passageiros. Isso aconteceu em Maringá (PR), e o resultado foi muito positivo. Então, sem dúvida, a tarifa zero por aqui teria esse impacto. O desafio, porém, seria fazer a integração com linhas do metrô e da CPTM, e, principalmente, seria necessária uma fonte de receita tarifária, porque o impacto no orçamento é muito grande. E o transporte tem um custo muitíssimo maior do que nas cidades pequenas.
Em São Caetano do Sul, esse aumento já está acontecendo?
Sim, o município relatou crescimento de 50% no primeiro dia de implementação da tarifa zero, em relação ao registrado antes. Mas ainda é muito cedo para avaliarmos, visto que a medida passou a valer em 1o de novembro. Importante trazer aqui o relato de Maricá (RJ), que tem tido aumento no uso do transporte mesmo muito tempo depois da implementação da medida, porque a população vai entendendo melhor a política e se apropriando do uso do transporte público. As pessoas vão compreendendo que podem usar os ônibus para outras finalidades, como lazer e consumo, e não só para o deslocamento ao trabalho. De forma que é ainda muito recente fazer afirmações sobre São Caetano do Sul. Mas há sinais de aumento.
Que particularidades de São Caetano do Sul você destaca?
São Caetano é uma cidade rica, com um município muito pequeno. Ao contrário de Mariana e Maricá, por exemplo, que têm área muito grande e, consequentemente, deslocamentos maiores também. De forma que, em geral, em São Caetano do Sul, os deslocamentos são menores, e a cidade tende a ter uma redução no uso do transporte (sem a tarifa zero), porque, naquele cenário, era mais vantajoso que as pessoas fossem caminhando. Agora, com a gratuidade, há o estímulo para que a população use mais o transporte público.
Tem crescido o número de municípios que aderiram à tarifa zero?
Sim, está aumentando. Na minha visão, isso ocorre por alguns motivos, como a repercussão das cidades que adotaram frente às vizinhas. Na região metropolitana de Fortaleza (CE), por exemplo, Eusébio aderiu primeiro, depois veio Aquiraz, e, mais recentemente, Caucaia, movimento que também se deu de forma parecida na região metropolitana de Belo Horizonte (MG). Outra questão é a crise que o setor enfrenta: como nas cidades pequenas os deslocamentos são menores e o uso do transporte não é tão alto, a tarifa é uma barreira bem mais sensível. E, com poucos passageiros, o serviço feito pelas operadoras fica inviável. Temos conhecimento de algumas que até devolveram a operação para as prefeituras. Então, sem a cobrança da tarifa, aumenta muito o uso do transporte. E, para algumas cidades, essa pode ser a solução para a crise.
SCS em números 165 mil habitantes 15 km2 de área 8 linhas de transporte público R$ 2,9 milhões por mês é o investimento da prefeitura na tarifa zero
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2023-11-15T08:00:00.0000000Z
2023-11-15T08:00:00.0000000Z
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