Norma dificulta ocultar capital após ordem judicial de bloqueio
Corretoras e distribuidoras de valores que não cumprirem decisões judiciais de bloqueio de ativos podem ser responsabilizadas
LAVÍNIA KAUCZ
“Apesar da previsão expressa a corretoras e distribuidoras, outras instituições autorizadas pelo BC podem ter as mesmas obrigações” Renata de Paula Procuradora da Fazenda Nacional
Uma nova norma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabelece que corretoras e distribuidoras de valores mobiliários que não cumprirem ordens judiciais de bloqueio de ativos de clientes poderão ser responsabilizadas pela dívida. A portaria regulamenta o Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário (Sisbajud), ferramenta utilizada por juízes para consultar saldos e bloquear contas de pessoas e empresas devedoras na Justiça.
O sistema funciona como ponte entre o Judiciário e as instituições financeiras, a quem cabe executar os bloqueios e entregar os dados requisitados pelos juízes. Embora o Sisbajud esteja em uso desde 2020, as regras vigentes até agora eram as mesmas que regiam o sistema anterior, o BacenJud. A nova regra do CNJ foi publicada no dia 14 de outubro e já está em vigor.
A norma determina que as corretoras são responsáveis solidárias pela dívida – ou seja, podem ser cobradas se não efetuarem o bloqueio “imediato e integral” dos valores depositados em seus sistemas. Na avaliação da procuradora Renata de Paula, que representou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) na edição da portaria, a lei já permite que os bancos sejam responsabilizados em caso de descumprimento de ordens judiciais. De acordo com ela, a previsão específica para corretoras na portaria do CNJ “ocorreu porque eram as instituições que mais precisavam de ajustes no procedimento”.
“Nos termos do artigo 927 do Código Civil, quem causar dano é obrigado a repará-lo. Ou seja, apesar da previsão expressa para corretoras e distribuidoras, as outras instituições autorizadas pelo Banco Central também podem ser chamadas a responder por prejuízos causados por descumprimento das regras do Sisbajud”, disse a procuradora ao Estadão/Broadcast.
Em relação aos bancos, também está prevista a criação de um portal que vai dar publicidade às instituições que descumprirem as ordens judiciais – uma espécie de ranking de bancos inadimplentes. A página deve ser publicada no site do CNJ no ano que vem e vai informar, mensalmente, o rol das instituições e o porcentual de solicitações não respondidas.
CELERIDADE.
De acordo com a procuradora, um dos objetivos da regulação é dar mais celeridade aos processos de execução fiscal, entre outras cobranças judiciais. Hoje, as execuções fiscais representam o maior fator de congestionamento do Judiciário – aproximadamente 34% do total de casos pendentes na Justiça – e são pouco eficientes – em torno de 2% do crédito tributário é recuperado.
A regulamentação também visa a agilizar o combate a crimes financeiros, como lavagem de dinheiro. “Em processos criminais, a descapitalização é essencial e é preciso um sistema efetivo, moderno, que converse de uma forma ágil com as instituições financeiras”, afirma Renata.
Outra novidade é a impossibilidade de transferência dos saldos para “operações compromissadas”. Até então, era comum que os atingidos esvaziassem a conta corrente, levando os valores para Certificados de Depósito Bancário (CDB) e Recibos de Depósitos Bancários (RDB), por exemplo, para fugir do bloqueio.
Para o advogado Renato Vieira, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), há dúvidas quanto à “possibilidade legal de se instituir uma nova forma de responsabilidade solidária por força de resolução”. Para ele, a responsabilização das corretoras deveria ser prevista em lei, e não em um ato infralegal.
Vieira também avalia que essa responsabilização delega uma atribuição do poder público para as instituições privadas. “Há uma tendência de privatização de uma atividade pública de controle”, disse.
Em nota, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse que o Sisbajud “é um importante e fundamental mecanismo para conferir efetividade às decisões judiciais, pois permite o rápido bloqueio de valores e investimentos”.
Procurada, a Associação Nacional das Corretoras de Valores (Ancord) disse que ainda está consultando os associados para formalizar um parecer sobre a regulamentação. •
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2024-11-04T08:00:00.0000000Z
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