O Estado de S. Paulo

‘Nossa geração ainda tem um ideal de amor romântico’

Gilberto Amendola g i l b e r t o . a mendola@ e s t a d a o . c o m

Em conversa com a coluna, Tainá Müller reflete sobre o amor romântico em um mundo cada vez mais louco. “Acho que esse mundo digital, onde você aperta um botão e é tudo muito instantâneo, traz pouca resiliência para uma construção em conjunto – que um relacionamento duradouro pede”. Claro, o assunto foi desaguar no amor porque Tainá celebra o sucesso do espetáculo Brilho Eterno, levemente baseado no filme Brilho Eterno De Uma Mente Sem Lembranças, de 2004. Na peça, dirigida por Jorge Farjalla , ela contracena com Reynaldo Gianecchini. Leia a seguir:

O que tem feito a plateia se identificar tanto por ‘Brilho Eterno’?

O espetáculo tem um aspecto que eu particularmente, como audiência, gosto muito – que é uma coisa meio agridoce. As pessoas riem muito, se divertem muito, mas no final... É tão engraçado porque muitos casais vão juntos. Então, tem uma parte em que subo em um cubo e vejo os casais se abraçando. Acho que não querendo se perderem ali... Tem uma ‘fungação’, uma galera chorando. É um tema universal – que anda um pouco esquecido.

Esse amor romântico?

Se a gente for ver, não se tem falado muito do amor romântico, da idealização. O cinema sempre tratou disso, mas acho que ultimamente a gente tá com coisas tão urgentes... O mundo passa por uma fase tão louca que o amor foi um tema que ficou um pouco para trás.

Por parecer superficial?

Acho que as pessoas estão sem coragem de viver o amor. Acho que esse mundo digital, onde você aperta um botão e é tudo muito instantâneo, traz pouca resiliência para uma construção em conjunto – que um relacionamento duradouro pede. Ao mesmo tempo, a gente é de uma geração muito de transição, porque os nossos pais ficavam juntos. Muitas vezes, uma vida inteira. Mas a nossa geração não está mais ficando... Também estamos um pouco sem referência. Acho que a próxima geração, a Geração Z, já nem se preocupa mais com isso, já é muito mais fluida mesmo. Acho que a peça fala muito da nossa geração específica – que ainda tem um ideal, nem que seja inconsciente, de construção de um amor romântico.

No filme, a personagem feminina parece apenas um acompanhamento para a história do homem. Na peça, isso não acontece...

Eu reparei nisso quando revi o filme – porque a nossa primei

“Se a gente for ver, não se tem falado muito do amor romântico, da idealização. O mundo passa por uma fase tão louca que o amor foi um tema que ficou um pouco para trás”

“(Sobre mudanças climáticas) É muito assustador pensar que daqui pra frente vai ser isso. E que a gente está pisando na imprevisibilidade. Como a gente vai encarar a vida desta forma?”

ra versão de roteiro era mais próxima ao filme. Tinha uma coisa ali que me incomodava, eu fiquei revendo o filme e entendi isso. O Brilho Eterno De Uma Mente Sem Lembrança é de uma fase em que o cinema focava nos homens difíceis. É o homem que tem a sua paz abalada por uma mulher, uma espécie de musa. No filme, o Joel (personagem do Jim Carrey) fica chateado com a Clementine (Kate Winslet) porque ela sai para beber (risos). Então, me perguntei quem seria aquela menina de cabelo azul hoje. A minha Celine, sim mudamos o nome para Celine (uma referência a personagem do filme Antes do Amanhecer), dá realmente um nó na cabeça do Joel. Ela é uma mulher livre, uma mulher bissexual, uma mulher que é apaixonada por ele, mas que aceita essa estranheza.

Tem uma boa relação com as redes sociais?

Minha relação é conflituosa. Por um lado, eu gosto. Eu adoro ver o que as pessoas estão pensando. Adoro, por exemplo, que a gente foi lá e invadiu as redes do Golden Globe para falar bem da Fernanda Torres. Eu amo esse fenômeno que é muito brasileiro, gosto de estar ali inserida. Porém, fico incomodada se eu sinto que tenho que viver para isso. A gente se estruturou como sociedade de uma forma em que as redes sociais se tornaram uma obrigação. Não à toa Mark Zuckerberg é multimilionário.

E agora parece ter uma aliança com o Trump...

Ele tá mostrando o que sempre foi na verdade. A gente precisa estar cada vez mais atento a isso. Tem muito a ver com política, tem muito a ver com a supremacia da indústria. Me preocupo muito com a democracia pelo mundo.

Durante as enchentes que atingiram o RS, você foi muito atuante. Mudanças climáticas estão entre suas principais preocupações?

Imagina o que foi ver as ruas que carregam toda a minha história assim, ver as marcas da enchente nas paredes... Estou vendo isso acontecer com amigos que moram em Los Angeles. As tragédias são opostas. Em Los Angeles, é o fogo. É muito assustador pensar que daqui para frente vai ser isso. E que a gente está pisando na imprevisibilidade. A vida está tomando esse aspecto assustador e de certa forma interessante. Nossas garantias estão derretendo. Como a gente vai encarar a vida desta forma?

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2025-01-20T08:00:00.0000000Z

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