O Estado de S. Paulo

Desemprego recua, mas ainda afeta 14 milhões

Lenta reação. Segundo o IBGE, foram gerados 3,1 milhões de vagas no trimestre até julho, ainda longe de recuperar o total de postos perdidos durante a pandemia; além disso, novas ocupações se concentram no mercado informal e oferecem menor remuneração

Vinicius Neder / RIO / COLABORARAM GUILHERME BIANCHINI e CÍCERO COTRIM / V.N.

A taxa de desemprego no País recuou para 13,7% no trimestre encerrado em julho, ante 14,7% no trimestre anterior, segundo dados do IBGE. Em um trimestre foram gerados 3,102 milhões de postos de trabalho, entre formais e informais. No acumulado de 12 meses, foram 7,014 milhões de vagas, mas o País ainda tem 14,085 milhões de pessoas sem trabalho.

Puxada pela geração de empregos em geral, incluindo tanto as vagas com carteira assinada quanto as informais, a taxa de desemprego recuou para 13,7% no trimestre encerrado em julho, ante 14,7% no trimestre anterior. Segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua divulgados ontem pelo IBGE, em um trimestre foram gerados 3,102 milhões de postos de trabalho, entre formais e informais. No acumulado de 12 meses, esse número chega a 7,014 milhões de vagas, mas o País ainda tem 14,085 milhões de pessoas na fila do desemprego.

Segundo Adriana Beringuy, analista da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE, o crescimento do número de vagas foi “bastante significativo”, mas ainda é insuficiente para recuperar o total de postos perdidos na crise causada pela covid19. Quando se compara o total de brasileiros ocupados no trimestre até julho (89,042 milhões de trabalhadores) com o contingente do início de 2020, antes da pandemia, são 5,109 milhões de empregos a menos.

O total de desempregados ficou 4,6% abaixo do contingente do trimestre móvel terminado em abril, com 676 mil pessoas a menos.

Para o economista Alberto Ramos, do Goldman Sachs, os dados não mudam a percepção de que o mercado de trabalho segue fraco. “A taxa de desemprego provavelmente continuará em dois dígitos por um longo período de tempo, à medida que o número ainda considerável de trabalhadores fora da força de trabalho (5,4 milhões) começar a procurar emprego e retornar à força de trabalho”, escreveu Ramos, em relatório.

A economista Claudia Moreno, do C6 Bank, projeta mais recuos da taxa de desemprego até o fim do ano, por causa da continuidade da recuperação da atividade econômica neste segundo semestre, mas o cenário será pior em 2022. “O PIB vai desacelerar bastante e ficar abaixo do potencial, então o desemprego volta a subir”, disse a economista, que prevê crescimento econômico de apenas 1,5% no próximo ano, bem abaixo da projeção de 5,2% para 2021.

Para Adriana Beringuy, do IBGE, no curto prazo a recuperação de vagas de trabalho se deve à normalização gradual das atividades econômicas, com o avanço da vacinação contra a covid-19 e a redução das restrições ao contato social. “Em julho, a vacinação chegou aos grupos etários mais envolvidos no mercado de trabalho. Isso acaba contribuindo, sim, para que as pessoas, uma vez vacinadas, voltem à sua dinâmica de circulação”, afirmou a pesquisadora.

Ela chamou a atenção para o crescimento do total de trabalhadores com carteira assinada. O trimestre encerrado em julho de 2021 mostrou a abertura de 1,027 milhão de vagas com carteira assinada no setor privado em relação ao trimestre encerrado em abril, um ritmo que ainda não havia sido registrado nos dados do IBGE. Mesmo assim, o grande motor da geração de vagas continua sendo o mercado informal. Na comparação com um ano antes, são 5,601 milhões a mais na informalidade, ou seja, 80% do total de postos criados nesse período foram de ocupações informais – no total, o Brasil tem 36,295 milhões de trabalhadores informais, segundo a Pnad Contínua.

A informalidade, ao lado da aceleração da inflação nos últimos meses, pesou sobre o rendimento dos trabalhadores. Segundo o IBGE, o rendimento médio do trabalho – ou seja, não leva em conta aposentadorias, pensões ou transferências de renda – ficou em R$ 2.508 ao mês no trimestre terminado em julho, queda de 8,8% ante um ano antes.

“Houve expansão da ocupação, porém esse aumento ocorre com trabalhos de remunerações menores do que um ano atrás, fazendo com que, na média, o rendimento seja menor”, explicou Adriana. “O crescimento da inflação que vem ocorrendo nos últimos meses também contribui para a queda real (no rendimento).”

Além de rendimentos mais baixos e da geração de vagas puxada pelo mercado informal, outros indicadores apontam para um crescimento do emprego com baixa qualidade. Por exemplo, o número de trabalhadores subocupados por insuficiência de horas trabalhadas – grupo que trabalha menos tempo do que gostaria – cresceu 7,2% ante o trimestre móvel imediatamente anterior, somando 7,730 milhões de pessoas, nível recorde da série histórica da Pnad Contínua, iniciada em 2012.

1.

A geração de 3 milhões de empregos é motivo para comemorar?

Todos os indicadores apontam para uma tendência de recuperação de vagas. Isso vai se dar porque, na pandemia, perdemos muitas vagas. Na Pnad, chegamos a ter 12 milhões de pessoas a menos ocupadas. O ponto é que essa recuperação, no primeiro momento, é de pior qualidade. Temos indícios de que essa retomada vem com uma piora na qualidade da ocupação das pessoas.

2.

Quais são os principais indícios disso?

Chama a atenção, de novo, a retomada das ocupações informais. Essas pessoas foram as mais prejudicadas pela pandemia. São pessoas que precisam recompor renda. A inflação está pegando muito fortemente nos itens básicos, como alimentação, combustíveis e energia elétrica. Esses trabalhadores precisam sair para as ruas para recompor a renda. O avanço da vacinação colabora para a volta dos informais (ao mercado de trabalho). Entre ganhar zero e ganhar menos do que ganhavam antes, as pessoas vão preferir ganhar menos. São empregos com qualificação pior e remuneração menor.

3.

O mercado de trabalho já não vinha com baixa qualidade de empregos antes mesmo da pandemia?

Já estávamos observando, entre 2017 e 2019, a “uberização” do mercado de trabalho. As relações trabalhistas vinham se enfraquecendo.

4.

A tendência é de reforçar esse padrão?

A pandemia acelerou um processo que já vinha acontecendo antes, de demanda maior por mão de obra qualificada, principalmente voltada para o setor de tecnologia. E o brasileiro, em média, não é qualificado o suficiente para preencher essas vagas.

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2021-10-01T07:00:00.0000000Z

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