O Estado de S. Paulo

Fazenda nega querer tributar todos os fundos após veto de Lula

Retirada de trecho inteiro do projeto sancionado provoca dúvidas sobre tributação de todos os tipos de fundos

MARIANA CARNEIRO

Um veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei com as primeiras regras da reforma tributária provocou dúvidas entre tributaristas com relação à incidência dos novos impostos sobre a totalidade dos fundos de investimentos.

Na sexta-feira, os escritórios de advocacia se debruçaram sobre as regras sancionadas na véspera por Lula para tentar interpretar o teor da norma. E a leitura preliminar é a de que pode haver uma brecha para a tributação.

Questionado pelo Estadão, o Ministério da Fazenda informou que o intuito nunca foi tributar com CBS (Contribuição sobre Bens Serviços) e IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que vão substituir os tributos atuais sobre consumo, os fundos com títulos e valores mobiliários – como os fundos de ações, de renda fixa e os multimercados. A pasta admitiu, contudo, que pode propor ajustes ao texto sancionado por Lula.

Os vetos do presidente ainda serão levados à votação no Congresso e podem eventualmente ser derrubados.

“Embora essa não seja a interpretação do Ministério da Fazenda, caso seja necessário fazer algum ajuste no texto para deixar claro que não há incidência de IBS e CBS sobre as aplicações dos fundos de investimento em títulos e valores mobiliários, o Ministério da Fazenda irá trabalhar para fazer esse ajuste”, disse em nota a Fazenda.

O problema está na decisão de vetar parte do artigo 26, que listava as exceções à incidência dos tributos.

Desde o início, a intenção do governo era tributar fundos que façam operações similares às que são passíveis de incidência de IBS e CBS, como os fundos imobiliários que alugam ou compram e vendem imóveis, os fundos de investimentos nas cadeias produtivas agroindustriais (Fiagros) e os fundos de investimentos de direitos creditórios (FDICs).

A Fazenda entendeu que o texto final aprovado pelo Congresso estabelece isenções para estes fundos sob algumas

“Embora essa não seja a interpretação do Ministério da Fazenda, caso seja necessário algum ajuste no texto a pasta irá trabalhar para esse ajuste”

Ministério da Fazenda

Em comunicado

condições, que não estavam previstas nos pilares da reforma tributária, aprovada em 2023, e que seria necessário vetar porque criavam renúncias tributárias que excedem o comando constitucional.

‘MIRA, MAS ERRA’. Porém, ao vetar todo o inciso que dava tratamento claro de isenção aos fundos de investimentos, na visão de analistas, é possível que não apenas estes fundos como todos os demais sejam passíveis de tributação.

“Mira numa coisa, mas acerta em outra”, afirma Diogo Olm Ferreira, sócio de Direito Tributário do VBSO Advogados, para quem os fundos de investimentos que tenham aplicado em debêntures, ações ou mesmo em títulos poderiam ser abrangidos pela tributação. “Vetaram o inciso inteiro, o que significa que todos os fundos de investimentos se tornaram contribuintes.”

Isso deriva, segundo ele, da leitura completa da norma, que determina o que é objeto de tributação da CBS e IBS. A definição de bens tributáveis afirma que operações onerosas com qualquer bem, inclusive direitos, está sujeita à incidência dos tributos.

“Não vejo lógica em tributar os fundos com valores mobiliários, mas a solução para essa dúvida estava no dispositivo que foi vetado”, disse. “É uma situação preocupante porque tributa, em princípio, todos os fundos.”

Henrique Palma, sócio da área tributária do escritório Cescon Barrieu, afirma que, numa primeira leitura, é possível concordar que todos os fundos seriam tributados, mas que a partir da análise do texto completo, inclusive da parte dedicada à tributação de serviços financeiros, é possível depreender que não é o intuito tributar a totalidade de fundos.

Palma afirma, no entanto, que em algumas seções o veto dará margem para diferentes leituras. “Não é todo fundo nem toda a atividade que será tributada. Está claro que um fundo imobiliário de tijolo ( que aluga ou compra imóveis) será tributado, mas um fundo imobiliário de papel ( que só negocia ativos financeiros) pode ou não ter essa interpretação.”

ECONOMIA&NEGÓCIOS

pt-br

2025-01-19T08:00:00.0000000Z

2025-01-19T08:00:00.0000000Z

https://digital.estadao.com.br/article/282011858021727

O Estado