Programa que leva luz a comunidades isoladas fica aquém de meta
Pesquisa mostra que Luz para Todos deixou de atender 18% do público-alvo; governo vê diferença em metodologia
LUCIANA DYNIEWICZ
Objetivo do Luz para Todos era fazer 29,7 mil ligações em 2024, mas energia não chegou a 18,4% dos endereços.
Um dos principais projetos do governo para fornecer energia limpa às comunidades isoladas da Amazônia Legal, o Luz para Todos, não atingiu suas metas em 2024. O programa tinha como meta conectar 29,7 mil unidades consumidoras de energia no ano, mas a luz não chegou a 18,4% delas, segundo levantamento do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec).
O Programa Luz para Todos estabelece metas anuais de universalização do acesso à energia, executadas pelas distribuidoras responsáveis pela área de concessão onde se encontra a comunidade beneficiada. Nas vilas isoladas da região, o fornecimento tem sido feito principalmente por sistemas solares, que, na maioria das vezes, substituem a geração a diesel e, assim, garantem acesso à energia limpa.
A pesquisa do Idec indica que há uma grande diferença entre os Estados da região no cumprimento das metas. Amapá e Pará, por exemplo, atingiram os objetivos. Por outro lado, Amazonas e Mato Grosso tiveram os piores desempenhos, com 6% e 7% da meta atingida, respectivamente.
CONTA DIFERENTE. Questionado, o Ministério de Minas e Energia (MME) informou que os números do Idec divergem de seus registros devido a diferenças metodológicas. Enquanto a pasta adota como critérios a data de homologação da ligação – que sucede à conclusão das fases técnicas, regulatórias e administrativas –, o Idec considera a data de ativação do fornecimento de energia. O MME, porém, reconheceu que o programa não atingiu a meta no ano passado.
“Em 2024, o programa atendeu 60.179 unidades consumidoras, beneficiando aproximadamente 240,7 mil pessoas. Esse resultado corresponde a 81% da meta anual estabelecida no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)”, diz nota encaminhada pela pasta. “Considerando o período acumulado entre 2023 e 2024, o PLPT (Programa Luz para Todos) atingiu 98% da meta prevista, totalizando 124 mil atendimentos.”
AVANÇO TÍMIDO. Na avaliação do coordenador do programa de energia do Idec, Lourenço Moretto, o Luz para Todos não tem avançado como deveria. Ele afirma que, além de as metas não estarem sendo alcançadas, há problemas até em localidades que já foram atendidas pelo programa.
Moretto cita que comunidades reclamam de não terem sido ouvidas pelas concessionárias e que há casos de unidades consumidoras onde foi instalado equipamento que não gera o volume suficiente para a demanda.
A população da Terra Indígena Wawi, localizada no território do Xingu, em Mato Grosso, que foi atendida pelo Programa Luz para Todos, reclama da confusão com a voltagem instalada na comunidade.
Erro de instalação Comunidade indígena no Xingu, atendida pelo programa, reclama da voltagem incorreta
De acordo com a liderança do povo Kisêtjê, Winti Suya, os moradores haviam pedido à concessionária, a Energisa, para o sistema solar ser 220 V. Isso porque os equipamentos da comunidade já eram dessa voltagem. O sistema instalado, porém, é 110 V.
Após solicitações de mudança, foram colocados transformadores nas casas, mas a população ainda aguarda a instalação de inversores. Suya afirma ainda que, em casas onde agora têm transformadores, só é possível usar um equipamento por vez – ou a televisão ou a geladeira, exemplifica ele.
Procurado, o MME disse ter constatado que o atendimento ao território do Xingu “não foi realizado nos parâmetros técnicos e de qualidade amparados pelo PLPT ( Programa Luz para Todos)” e que notificará a Energisa, “determinando que as demandas da população local sejam atendidas, caso contrário, os atendimentos não serão reconhecidos no âmbito do Programa Luz para Todos e, consequentemente, a distribuidora não terá direito a receber recursos previstos do programa”. A pasta também afirmou que a substituição dos inversores instalados, de 127 V para 220 V, será uma das ações solicitadas à empresa.
O QUE DIZ A EMPRESA. A Energisa, porém, disse ter cumprido “todos os requisitos técnicos e regulatórios previstos no programa Luz para Todos nas instalações realizadas em territórios indígenas no Estado de Mato Grosso”. Disse ainda que, “prezando pelo diálogo e transparência, a companhia apresentou à Aneel um plano de ação que prevê o fortalecimento do relacionamento com os indígenas daquela região”.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) informou ter visitado a comunidade Wawi no começo de abril e convocado uma reunião com a Energisa para buscar soluções. “A fiscalização da agência no momento acompanha plano de ação apresentado pela distribuidora de Mato Grosso para resolução dos problemas apresentados”, afirmou em nota. •
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