Com a presença de Lula, Vale lança projeto de R$ 70 bi no PA
Evento em Parauapebas marca a reaproximação do presidente com a mineradora; Lula disse que não quer mais ‘ruído’ na relação
JULIANA GARÇON CAIO SPECHOTTO A REPÓRTER VIAJOU A PARAUAPEBAS (PA) A CONVITE DA VALE
Com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Vale lançou ontem, em evento no Pará, o programa Novo Carajás, destinado à expansão da mineração de ferro e cobre nas áreas de exploração da companhia no município de Parauapebas. Com previsão de investimento de R$ 70 bilhões deste ano até 2030, o programa busca sustentar o crescimento da produção de minério de ferro da Vale e também acelerar a expansão da produção de cobre, conforme projeções (guidances) divulgados pela empresa ao mercado.
O presidente Lula chegou no fim da tarde às instalações da Vale no Pará. Ele já tinha ido a Carajás em 2004, em seu primeiro mandato, para a inauguração de uma das minas da empresa na região. Na época, o CEO da mineradora era Roger Agnelli, com quem Lula tinha proximidade. Agnelli deixou a presidência da Vale em 2011, e morreu em um acidente aéreo em 2016.
O cenário, no entanto, é diferente neste seu terceiro mandato. Ao longo dos dois últimos anos, Lula fez duras críticas ao modelo de gestão da mineradora, além de reivindicar maior poder de voz do gover
No topo Presidente Lula diz que quer ver a Vale de volta à ‘série A’; empresa é hoje a 14ª do mundo
no no conselho de administração da empresa. Cobrou também que a mineradora precisava fazer mais investimentos no País.
Além do aceno ao governo com os aportes anunciados agora, a Vale quer garantir também uma posição de liderança na transição energética, uma vez que o cobre é cobiçado por ser usado em baterias elétricas e equipamentos de energia renovável.
Já os investimentos em minério de ferro vão atender à necessidade de reposição de minas em exaustão e à expansão de 20 milhões de toneladas na mina S11D, segundo pessoas próximas da companhia.
NOVA ETAPA. A solenidade de ontem, portanto, pode ser o prenúncio de uma nova etapa nas relações da Vale com o governo. Há um ano, pressões do Planalto para emplacar o exministro Guido Mantega como CEO da mineradora levaram tensão à companhia e a um racha dentro do seu conselho de administração.
O escolhido pelos acionistas, porém, foi Gustavo Pimenta, executivo que era diretor financeiro da mineradora. Desde então, a Vale conseguiu fechar dois acordos envolvendo o governo federal: a compensação pelo desastre de Mariana, com pagamento de R$ 100 bilhões (além de obrigações a fazer), e a revisão de valores da renovação antecipada de duas ferrovias (Vitória-Minas e Carajás), pelas quais vai desembolsar R$ 17 bilhões.
No fim do mês passado, o presidente teve um encontro com Pimenta, o novo CEO, no Palácio do Planalto. O executivo teria mostrado ao presidente os planos que foram apresentados ontem.
Ontem, na solenidade em Carajás, Lula disse que a gestão de Pimenta é uma oportunidade para desfazer uma separação entre os interesses da empresa e do Estado brasileiro. “O Estado também tem interesse que a Vale cresça”, disse.
Segundo ele, houve “um fio desencapado” entre a companhia e alguns governos, mas que em sua gestão não haverá mais ruídos nessa relação.
As boas relações com o governo são cruciais para a mineradora, que depende de concessões e licenças federais – inclusive ambientais – para desenvolver minas e sistemas de logística, com ferrovias e terminais portuários.
Ainda na solenidade, Lula afirmou que, se depender do governo, a Vale será uma das maiores mineradoras do mundo, o que a empresa já é. “Me ajuda, Pimenta, a fazer com que a Vale volte a ser a primeira empresa do mundo em mineração de ferro, de minerais críticos, em mineração do que quiser. E, sobretudo, a primeira do mundo no tratamento respeitoso ao povo que trabalha com vocês”, disse o presidente. •
Aos 53 anos, Belmiro Gomes, CEO do Assaí, está prestes a completar 40 de carreira. Ainda na infância, foi boia-fria, engraxate e vendedor de sorvetes. Para manter a longevidade profissional, adotou um estilo de gestão pouco convencional entre muitos CEOs: procura as más notícias e prefere estar cercado de pessoas que discordem dele.
A razão para a estratégia, segundo o executivo, é evitar o que considera ser o maior risco para um líder. “O poder pode ser um grande inimigo para quem chega a posições de liderança. Se você se isola, acaba vivendo a solidão do poder. E o poder pode ser muito solitário”, afirma.
Outro hábito do CEO é buscar feedbacks informais de funcionários e clientes. A seguir, trechos da entrevista:
Como foi o início da sua carreira?
Nasci em Santo André (SP), mas fui para Maringá (PR) aos 9 anos. Meu pai desenvolveu uma doença imunológica rara. Trabalho desde os 9 anos de idade. Para conseguir pagar o material escolar na 4.ª série, fui vender sorvete, pastel. Também fui engraxate. Para complementar a renda, além de estudar, eu fazia bicos. Também atuei por um ano na Musamar (rede de supermercados). Na época, o Atacadão estava fazendo uma migração de sistema. Entrei no Atacadão em 1988 como digitador. Não te
“Quando visito alguma das lojas da rede, sento para almoçar com o pessoal, proíbo, inclusive, as pessoas da diretoria de almoçarem fora, vai sentar junto”
nho curso superior, só ensino médio, era muito difícil conciliar tudo isso. No Atacadão, fiquei por 22 anos. Passei por diversas áreas, desde a parte financeira, supervisão de vendas, compras, gerência, até que, em 2000, comecei a fazer trabalhos para a diretoria. Os proprietários ficavam aqui em São Paulo e me transferiram para cá como assessor da diretoria, em 2002.
Como foi a transição para o alto escalão?
Me tornei presidente da companhia (Assaí) em torno dos 40 anos de idade. O que normalmente não ocorre. Mas também comecei muito jovem. O fato de ter trabalhado no Atacadão, que tinha três famílias como donas, foi fundamental. Fazia desde o serviço de expansão, quando o Atacadão ia entrar em novas praças, até a parte tributária e o desenvolvimento de sistemas.
Como define o seu estilo de liderança?
Nós não estamos no Exército. As pessoas fazem a empresa. Na vida, você vai aprendendo que não importa só o que você fala. Importa muito mais a forma como você fala e as suas ações. Os colaboradores vão observar se o seu discurso bate com a sua prática. A gente tenta se manter muito próximo, buscando uma liderança pela inspiração. Mesmo que isso leve mais tempo do que simplesmente dar ordens. Obviamente, você vai ter sucesso com alguns indivíduos e com outros não. Mas a liderança é pela inspiração. E não é por que as pessoas aqui são melhores. Seria arrogante dizer: ‘Nossas pessoas são melhores.’ O que faz a diferença para a companhia são as nossas atitudes. À medida que outros líderes também absorvem isso, a cultura acaba criando um efeito cascata.
Você mencionou que nas visitas a bancos e outros estabelecimentos, costuma passar pelas copas para conversar com as pessoas e pedir feedbacks e ouvir eventuais reclamações. Você adota essa prática no Assaí? Muito. Quando vou às lojas, sento para almoçar com o pessoal, proíbo, inclusive, as pessoas da diretoria de almoçarem fora, vai sentar junto. Tem um exemplo clássico da cadeira. Em uma visita a uma unidade, uma operadora de caixa reclamou da cadeira depois que insisti umas três vezes, porque ela dizia que estava tudo bem. Nunca acredito no primeiro ‘tudo bem’. Eu disse: ‘Fala a verdade’. Talvez ela tenha pensado várias vezes: ‘Se eu estivesse com o presidente, ia reclamar disso, disso e disso’. Eu disse: ‘Estou aqui do seu lado. E aí?’. Naquela situação a reclamação foi a respeito da cadeira. A cadeira não era confortável para quem ficava muito tempo atendendo clientes. Isso resultou na troca de cadeiras de todas as unidades do Brasil. Quem está vendo a operação vai ter detalhes que a diretoria não percebe, principalmente em uma companhia muito grande.
Como esse comportamento o fez evoluir como líder? Muita humildade. Você precisa ter humildade e cautela com o poder para não ficar fechado em si mesmo. Quando você percebe, já está vivendo em um mundo à parte. É como na música do Cazuza: ‘Tua piscina está cheia de ratos, tuas ideias não correspondem aos fatos…’. Então, há sempre uma busca por entender de fato a realidade, mesmo que você enfrente um problema que não consegue corrigir ou que não dá tempo de resolver. Acho que minha origem me ajuda muito a me conectar com o cliente e com o funcionário. Percebo que a empatia é genuína.
Você comentou sobre o perigo do poder. O que faz para lidar com o ego e o sentimento de poder que cercam o cargo de CEO?
Esse é sempre um ponto de atenção. Acho que a pessoa precisa ter autocuidado e se cercar de pessoas que discordem dela e falem o que não quer ouvir. É fundamental ser aberto. É importante manter a humildade para não ficar fechado e cego dentro de uma bolha. O orgulho humano é um dos piores inimigos. A gente também comete erros e está sempre buscando aprimoramento nesse sentido. Mas o poder pode ser um grande inimigo para quem chega a posições de liderança. Se você se isola, acaba vivendo a solidão do poder. O poder pode ser muito solitário. •
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