Após bônus a auditores, pressão de servidores por reajuste sobe
Policiais federais também obtiveram aumento em 2023
DANIEL WETERMAN
Funcionários do Executivo federal pressionam por reajuste de 22,71% a 34,32% de forma parcelada até 2026, com parte dos aumentos já em 2024. Após um ano de trégua, há ameaças de greves em massa. O governo Lula, por sua vez, apresentou uma contraproposta de no máximo 19,3% em aumentos ao longo do mandato, também de forma escalonada até 2026, mas sem nenhum
reajuste neste ano. A pressão aumenta porque duas categorias já saíram na frente: policiais federais tiveram reajuste no ano passado e auditores da Receita conseguiram um bônus maior. O acordo prevê o pagamento de um valor extra progressivo já a partir deste ano: o teto começa em R$ 4,5 mil e chega a até R$ 11,5 mil em 2026. O movimento dos servidores representa um desafio para o governo, que precisa responder à sua própria base aliada sindical, enquanto promete colocar as contas públicas em dia – com a meta de déficit zero neste ano.
“Se o governo não incluir os servidores, teremos de subir o tom e colocar o bloco na rua a partir de março, abril” Sérgio Ronaldo da Silva, da CNT
Servidores públicos federais prometem acabar com a trégua que ocorreu no primeiro ano do novo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aumentar a pressão por reajustes salariais e benefícios neste ano, ameaçando até com greves em massa. O governo enfrenta o desafio de responder à sua própria base aliada sindical ao mesmo tempo que promete colocar as contas públicas em dia – com a meta de déficit zero neste ano. Duas categorias já saíram na frente: policiais federais tiveram reajuste no ano passado e auditores da Receita conseguiram um bônus maior.
Os funcionários do Executivo federal pedem um reajuste de 22,71% a 34,32% de forma parcelada até 2026, com parte dos aumentos já em 2024. Os valores são divididos em dois blocos e variam dependendo do tipo de acordo que cada categoria fechou nos últimos anos.
O governo Lula, por sua vez, apresentou uma contraproposta de no máximo 19,3% em aumentos ao longo do mandato, também de forma escalonada até 2026, mas sem nenhum reajuste neste ano. A próxima reunião da Mesa Nacional de Negociação está marcada para o dia 28. No ano passado, houve aumento linear de 9%.
A intenção é fazer uma negociação para todo o período do terceiro mandato de Lula à frente da Presidência da República. Todas as categorias, incluindo professores, agentes ambientais e funcionários administrativos de carreira, seriam beneficiadas.
Algumas, porém, já foram atendidas. No ano passado, o governo reajustou o salário dos policiais federais. Neste ano, já avançou com o aumento do bônus por eficiência para os auditores da Receita Federal, aprovado após quase três meses de greve da categoria. O acordo prevê o pagamento de um valor extra progressivo já a partir deste ano: o teto começa em R$ 4,5 mil e chega a até R$ 11,5 mil em 2026.
INCENTIVO. A negociação motivou outras carreiras, como os servidores do Banco Central (BC), a também reforçar suas demandas. Na semana passada, um dia após a aprovação do bônus dos auditores, os servidores do BC rejeitaram uma contraproposta do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos de reajuste de 13% parcelado para 2025 e 2026, e aprovaram paralisação de 48 horas nos próximos dias 20 e 21.
Atualmente, o governo federal tem 571.873 servidores em atividade, além de 417.115 aposentados e 234.225 pensionistas, totalizando 1,2 milhão de pessoas na folha salarial da União. Em 2023, os gastos com pessoal foram de R$ 290 bilhões. A maioria dos servidores ativos ganha de R$ 3 mil a R$ 15 mil.
O Orçamento de 2024 tem R$ 1,75 bilhão reservado para aumento de remunerações do Executivo. Do total, R$ 1,1 bilhão ficou carimbado para o bônus dos auditores da Receita, R$ 131 milhões foram destinados para os auditores fiscais do trabalho e R$ 503,7 milhões ficaram reservados para outras carreiras que vierem a ser beneficiadas por algum projeto de lei de aumento.
O valor, porém, é insuficiente para um novo reajuste linear e é apenas residual nas contas da União. Na prática, o Orçamento deste ano foi aprovado sem nenhuma previsão de aumento para servidores.
“Todos os setores estão incluídos no Orçamento e nós queremos estar incluídos também. Se o governo continuar com o discurso de que tem de melhorar a economia, e não incluir os servidores, nós teremos de subir o tom e colocar o bloco na rua a partir de março, abril”, afirma o secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal, Sérgio Ronaldo da Silva.
O dirigente sindical cita a possibilidade de greves. “Não é porque o presidente Lula já foi sindicalista que temos de ter mais paciência. Não estamos sendo prioridade”, afirmou.
PERSPECTIVA. Recentemente, a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther
Dweck, sinalizou com a possibilidade de um reajuste linear em 2024. A depender do desempenho da arrecadação, poderia haver a abertura de um crédito suplementar de R$ 15 bilhões em novas despesas no Orçamento, decorrente de uma regra do novo arcabouço fiscal, e uma parte – ela não disse quanto – seria direcionada para o reajuste, como antecipou o Estadão em setembro do ano passado. O aumento, porém, depende de um cenário incerto para as contas públicas.
O governo conta com uma arrecadação maior do que o esperado para assumir esses e outros compromissos. Também espera vencer batalhas com o Congresso, como no caso da reoneração da folha de pagamentos.
As incertezas envolvem a meta de zerar o déficit das contas públicas neste ano, defendida pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda), que pode ficar ameaçada se houver frustração de receitas ou aumento de gastos. •
“Se o governo continuar com o discurso de que tem de melhorar a economia e não incluir os servidores, nós teremos de subir o tom” Sérgio Ronaldo da Silva
Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal
Sem um novo reajuste linear de salário aos servidores, o governo optou por negociar a correção de benefícios como valealimentação e auxílio-creche, usando recursos já aprovados no Orçamento da União. A verba para compra de alimentos ou refeições, por exemplo, passará de R$ 658 para R$ 1 mil mensais a partir de 1.º de maio.
Governo e funcionalismo não têm estimativas sobre o impacto de possíveis reajustes nos próximos anos. “O direito de reivindicação é legítimo. Caso haja algum acordo para reajuste de salários, ou para aumento (do número) de cargos, isso tem de estar demonstrado na peça orçamentária e ser compatível com as regras fiscais, o que é um pouco difícil – e há incertezas em torno da meta”, diz a economista Vilma da Conceição Pinto, diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado.
O Orçamento de 2024 prevê déficit zero nas contas públicas, alvo que enfrenta a desconfiança do mercado. “(A meta) Não vai ser cumprida”, diz o economista-chefe da XP, Caio Megale (mais informações nesta página).
Uma queixa dos funcionários do Executivo se refere à diferença de salários em relação a de outros Poderes. O Judiciário é o setor público mais bem remunerada no País. Conforme o Estadão mostrou, um servidor do Judiciário recebia, em média, R$ 8,9 mil por mês em 1985, em valores atuais. Em 2021, o valor saltou para R$ 16 mil, mais que o dobro da média do funcionário do Legislativo (R$ 7,3 mil) e do Executivo (R$ 4,5 mil).
Só o bônus concedido à Receita custará R$ 1,1 bilhão em 2024 e o impacto crescerá ao longo dos anos, pois o benefício é progressivo até 2026 e depois terá reajuste pela inflação.
Além da incerteza sobre a arrecadação, outros gastos disputam espaço se houver sobra. O governo quer recompor o orçamento de órgãos federais que tiveram verbas reduzidas pelo Congresso. Os parlamentares, por sua vez, querem recuperar os R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão vetados pelo presidente Lula. “Com o reajuste dentro de um órgão, pode faltar dinheiro para outras coisas”, diz Vilma.
RESPOSTA. Ao Estadão, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos disse que “a recomposição e valorização da força de trabalho na administração pública federal é pauta prioritária do Ministério da Gestão para recuperar a capacidade de atuação do governo, para a execução de políticas públicas, dentro dos limites orçamentários, para atender às demandas dos órgãos e entidades”. •
Remuneração Uma das queixas dos funcionários do Executivo é a diferença dos salários em relação a outros Poderes
PRIMEIRA PÁGINA
pt-br
2024-02-15T08:00:00.0000000Z
2024-02-15T08:00:00.0000000Z
https://digital.estadao.com.br/article/281887303224700
O Estado