Governo aposta no STF se TCU não rever bloqueio a verba do Pé-de-Meia
Após AGU entrar com recurso, Executivo age para derrubar bloqueio; decisão atinge verbas de fundos privados para o programa que não passaram pelo Orçamento
PAULA FERREIRA DANIEL WETERMAN
TCU bloqueou recursos de fundos privados direcionados ao programa que não passaram pelo Orçamento.
Após o Tribunal de Contas da União (TCU) bloquear cerca de R$ 6 bilhões do programa Pé-de-Meia, do Ministério da Educação (MEC), na quarta, o governo federal trabalha com o cenário no qual a decisão será derrubada a tempo de o pagamento de fevereiro ser efetuado. Ainda na quarta, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com recurso no TCU contra a decisão. Além disso, o ministro da Educação, Camilo Santana, entrou em ação e tem dialogado com membros do Tribunal de Contas.
O TCU bloqueou os recursos de fundos privados que foram direcionados para o Péde-Meia e não passaram pelo Orçamento. O programa envolveu uma operação complexa que somou R$ 12,1 bilhões em 2024. Desse valor, foram pagos R$ 5,6 bilhões diretamente aos estudantes. O entendimento da Corte de Contas é de que o governo não poderia ter operado o programa dessa forma, pois se desviou da Lei Orçamentária Anual e dos limites fiscais ao pagar a bolsa aos estudantes. O uso dos fundos foi autorizado por lei, mas os gastos em si ocorreram por fora do Orçamento.
O tema tem sido acompanhado de perto pela Secretaria Especial de Assuntos Jurídicos (SAJ) da Casa Civil. Caso sofra derrota no recurso oferecido ao TCU, o governo vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em um cenário como esse, o único receio é de que a relatoria do tema caia com ministros alinhados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, caso de André Mendonça e Nunes Marques. O MEC e o Ministério de Planejamento e Orçamento foram procurados para falar sobre o que será feito, mas não responderam.
Um dos principais programas do governo, o Pé-de-Meia é uma bolsa criada para beneficiar estudantes de ensino médio com R$ 200 por mês e uma poupança adicional de R$1 mil ao fim de cada ano da etapa.
No momento, o MEC não trabalha com a hipótese de não conseguir pagar o benefício em fevereiro. A principal aposta do governo é a reversão na Justiça. Há uma visão de que ninguém quer ter na conta a paralisação de um programa que chega a cerca de 4 milhões de jovens de baixa renda.
O Estadão apurou que a derrota no plenário do TCU já era esperada pelo governo, uma vez que o colegiado tende a confirmar decisões tomadas individualmente pelos ministros e indicadas pela equipe técnica. No recurso da AGU, o governo pede que o TCU suspenda imediatamente a medida que proíbe o MEC de destinar recursos dos fundos o programa. A AGU sustenta que não há ilegalidade no programa e pede que, caso o bloqueio seja mantido, ele tenha validade só em 2026. Pede ainda prazo de 120 dias para que o governo apresente um plano para cumprir a decisão sem prejudicar o programa.
SE BLOQUEIO CONTINUAR. Em caso de derrota nos tribunais, o governo precisará de mais
R$ 3,6 bilhões para cumprir a decisão do TCU, colocar o Péde-Meia no Orçamento e não parar o programa em 2025, segundo o economista e pesquisador do Ipea Camillo Bassi. Ele diz que o Executivo tem de onde tirar esse recurso. O Péde-Meia tem um custo de cerca de R$ 5,7 bilhões por ano. Há uma sobra de R$ 1,1 bilhão no fundo do programa que o TCU autorizou o governo a gastar, pois não vem dos fundos privados questionados pela decisão, mas de um dinheiro colocado pela União e que passou pelo Orçamento. Além disso, há R$ 1 bilhão proposto pelo governo no Orçamento de 2025, que ainda não foi aprovado no Congresso Nacional. Faltariam, portanto, R$ 3,6 bilhões. Esse dinheiro tem de sair de algum lugar.
O governo pode tirar os recursos do ensino em tempo integral, que entrará no guardachuva do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), segundo medida do pacote de corte de gastos aprovado em 2024. A verba para a escola integral é de R$ 4,8 bilhões em 2025, suficiente para completar o recurso que falta no Pé-de-Meia. O Ministério da Fazenda já manifestou interesse em usar esse espaço fiscal para o programa, mas ainda não implementou a medida.
PROBLEMAS. “A solução contábil que existe é essa”, diz o economista. A alternativa ainda traz alguns problemas financeiros, pondera Bassi. Além de consumir o espaço fiscal do pacote de corte de gastos, parte das verbas do Pé-de-Meia seria custeada com recursos do Salário Educação – contribuição paga por empresas, destinada a merenda escolar, compra de livro didático, ônibus escolar e investimentos diretos nas escolas. Nesse caso, esses programas ficariam descobertos e consumiriam os recursos de outros impostos da União. Para ele, no entanto, é o melhor caminho, porque acaba com os gastos paralelos considerados ilegais e inconstitucionais pela Corte de Contas. •
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2025-01-24T08:00:00.0000000Z
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