O Estado de S. Paulo

Fux chama presidente e pede respeito à Constituição

Presidente do STF tem conversa reservada com Bolsonaro após ataques feitos a Barroso, chamado pelo presidente de ‘imbecil’

Weslley Galzo Marcelo de Moraes

O presidente do STF, Luiz Fux, convidou Jair Bolsonaro e, numa conversa reservada, pediu ao presidente que “respeite os limites da Constituição”. O diálogo ocorreu dias após Bolsonaro ameaçar impedir as eleições de 2022, caso não seja adotado o modelo de voto impresso no País, e chamar o presidente do TSE, Luis Roberto Barroso, de “imbecil” e “idiota”. Bolsonaro se comprometeu a adotar um tom mais moderado.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, chamou ontem o presidente Jair Bolsonaro para uma conversa reservada e pediu a ele que respeitasse “os limites da Constituição”. O diálogo ocorreu dias após Bolsonaro ameaçar impedir as eleições de 2022, caso não seja aprovado no Congresso o modelo de voto impresso, e xingar o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luis Roberto Barroso, de “imbecil” e “idiota”.

Bolsonaro se comprometeu a adotar tom mais moderado e apresentou ali a indicação do advogado-geral da União, André Mendonça, para ocupar a cadeira de Marco Aurélio Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) que se aposentou compulsoriamente ontem, aos 75 anos. Cumpriu, assim, a promessa de indicar um nome “extremamente evangélico” para a Corte. “Pedi a ele que, uma vez por semana, comece a sessão (no Supremo) com uma oração”, disse o presidente. Mendonça é pastor e seu nome ainda terá de ser apreciado pelo Senado.

O anúncio do advogado-geral da União para a vaga no Supremo não consumiu nem dez minutos da conversa entre Bolsonaro e Fux. O presidente da Corte disse ser preciso apaziguar a tensão entre os Poderes e pediu a Bolsonaro que desse uma trégua nos ataques, classificados como “golpistas” não apenas pelo Judiciário, mas também pelo Legislativo.

“Convidei o presidente da República para uma conversa, diante dos últimos acontecimentos, onde nós debatemos o quão importante é para a democracia brasileira o respeito às instituições e os limites impostos pela Constituição Federal”, afirmou Fux, em entrevista após a reunião. O magistrado disse que, durante o encontro, Bolsonaro recorreu a uma fábula evangélica sobre perdão, demonstrando que entendeu o movimento para estancar a crise.

Pressionado pela queda de popularidade cada vez mais acentuada e por manifestações de rua pedindo o seu impeachment, Bolsonaro tem sido aconselhado a mudar, se não quiser perder apoio até mesmo do Centrão, bloco informal de partidos que o sustentam no Congresso.

“Sou Jairzinho paz e amor”, disse ele ontem, após a conversa com Fux, numa alusão à frase usada pelo então candidato Luiz Inácio Lula da Silva pouco antes de se eleger presidente pela primeira vez, em 2002, quando se apresentou com discurso conciliatório e mais simpático ao centro político. A nova versão de Bolsonaro, no entanto, não demonstrou ter novo entendimento sobre o voto impresso.

Na semana passada, Bolsonaro havia dito que “ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições”. Ontem, ele afirmou que “devemos mostrar para o mundo que o Brasil é um país sério, com eleições limpas, auditáveis”. A proposta do voto impresso deve passar, na próxima quinta-feira, pelo crivo da comissão especial da Câmara formada para analisar o assunto, mas a tendência é que seja derrotada. “Aí vamos bater na tecla da contagem de votos”, insistiu o presidente. Bolsonaro atribui a Barroso as articulações políticas para barrar a aprovação da proposta que institui o voto impresso no Brasil.

Pai Nosso. Quando questionado se estava arrependido de ter xingado Barroso -- que, além de comandar o TSE, também integra o Supremo --, Bolsonaro ameaçou parar a entrevista. “Depois vocês dizem que eu sou grosseiro”, reclamou. Logo após a queixa, porém, pediu que todos os repórteres rezassem junto com ele o Pai Nosso.

O presidente afirmou que falou sobre a oração com Fux. “Eu disse que devemos perdoar as nossas ofensas assim como perdoamos a quem nos tem ofendido. Estamos perfeitamente alinhados e respeitosos para com a Constituição e cada um se policiará dentro do seu poder, no tocante a seus limites. E nós, do Executivo, não pretendemos sair dos limites”, afirmou.

Pela manhã, o presidente disse que tem sido alvo de “gente importante”. “Os problemas fazem parte. Sabia que ia ser difícil, mas esperava contar com mais gente importante do meu lado. Lamentavelmente, muita gente importante aí boicota”, disse Bolsonaro a apoiadores na porta do Palácio da Alvorada.

A reunião com Fux não esgotou as tratativas de conciliação. O presidente do Supremo disse que uma nova reunião será realizada para tratar da relação institucional entre os Poderes e fixar “balizas sólidas para a democracia brasileira”. A conversa, ainda sem data definida, contará com a presença do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-al), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).

“Nossas instituições são fortalezas que não se abalarão com declarações públicas e oportunismo”, escreveu Lira no Twitter há dois dias. “Enfrentamos o pior desafio da história com milhares de mortes, milhões de desempregados e muito trabalho a ser feito”.

Depois da reunião entre Bolsonaro e Fux, ontem, o deputado foi ainda amais enfático. “A presidência da Câmara tem compromisso com a democracia, com as pautas que desenvolvam o País, com a harmonia, com a governabilidade. A Câmara dos Deputados não tem compromisso algum com qualquer tipo de ruptura política, institucional e democrática”, argumentou.

• ‘Democracia’

“Debatemos o quão importante é para a democracia brasileira o respeito às instituições e os limites impostos pela Constituição Federal.”

Luiz Fux

PRESIDENTE DO STF

Primeira Página

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2021-07-13T07:00:00.0000000Z

2021-07-13T07:00:00.0000000Z

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