O Estado de S. Paulo

Declaração de Aziz gera atrito com as Forças Armadas

Durante sessão da comissão, presidente do colegiado citou ‘lado podre’ da corporação; Defesa classifica fala como ‘irresponsável’

Felipe Frazão Daniel Weterman Amanda Pupo/

O Ministério da Defesa e a cúpula das Forças Armadas entraram ontem em atrito com a CPI da Covid. Os militares reagiram após o presidente da CPI, Omar Aziz (PSDAM), criticar o “lado podre” das Forças Armadas por envolvimento em “falcatrua” no governo Jair Bolsonaro. Em nota, o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica repudiaram a declaração, classificada como “grave, infundada e irresponsável”.

“As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”, diz o comunicado, que não entrou no mérito da prisão do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, determinada por Aziz. Dias foi solto à noite após pagar fiança.

As investigações da CPI levantaram suspeitas de envolvimento de uma série de oficiais, da ativa e da reserva, em irregularidades durante a pandemia do novo coronavírus. Parte deles foi levada para o Ministério da Saúde durante a gestão do general Eduardo Pazuello, que comandava a pasta, enquanto outros estariam ligados a tentativas de venda de vacinas ao governo.

Foi ao dizer que Dias mentia reiteradamente em seu depoimento que Aziz mencionou os militares. “Os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia, porque fazia muito tempo, fazia muitos anos que o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo”, afirmou o senador durante a sessão. “Uma coisa de que a gente não os acusava era de corrupção, mas, agora, Força Aérea Brasileira, coronel Guerra, coronel Elcio, general Pazuello... E haja envolvimento de militares das Forças Armadas.”

No plenário do Senado, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), tentou apaziguar as críticas e manifestou respeito às Forças. “Vossa Excelência deveria dizer ‘a nota é desproporcional. Eu não aceito que se intimide um senador da República’”, reclamou Aziz para Pacheco.

Depois, virando-se para o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDBPE), reforçou a crítica. “E Vossa Excelência sabe muito bem que eu nunca desrespeitei as Forças Armadas. Os meus respeitos aos grandes brasileiros que fazem parte das Forças Armadas e meu desrespeito total àqueles envolvidos com falcatruas”, disse ele.

O senador bolsonarista Marcos do Val (Podemos-es) disse que o presidente da CPI se desfez das Forças Armadas. Aziz voltou a reiterar a crítica: "O que eu quero explicar é que, infelizmente, o que nós temos ouvido aqui nos relatos do depoente é que geralmente tem alguém das Forças Armadas. Isso não é bom para o Brasil. Não é bom".

A prisão de Dias também dividiu os integrantes da CPI e provocou críticas até entre velhos aliados, que compõem o grupo G-7. Em público, porém, todos negaram um racha na comissão após a ordem dada por Aziz.

O senador foi criticado por ter dado ordem de prisão a Dias após ignorar apelos para a detenção de outras testemunhas ouvidas na comissão, entre elas o exministro da Saúde Eduardo Pazuello, o ex-secretário de Comunicação Social Fabio Wajngarten e o policial militar Luiz Paulo Dominghetti, que acusou Dias de pedir propina na negociação de vacinas contra covid-19.

Após a decisão, senadores questionaram a ordem de Aziz. “O presidente da CPI tem autonomia para decretar a prisão do depoente por falso testemunho e isso deve ser respeitado, mas questiono a falta de isonomia na decisão. Dias não foi o primeiro a mentir flagrantemente na comissão. É importante manter o foco: são mais de 525 mil mortos”, disse o senador Alessandro Vieira (Cidadania-se). Aziz, porém, manteve a ordem de prisão. Parlamentares avaliaram que a decisão serve como um recado para testemunhas e investigados que serão ouvidos a partir de agora.

A partir de agora, a CPI deve avançar na investigação sobre denúncias de corrupção no governo do presidente Jair Bolsonaro. Dias é apontado como um importante elo nessa apuração, embora tenha negado articulação para compra das vacinas.

Política

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2021-07-08T07:00:00.0000000Z

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