O Estado de S. Paulo

TCU afasta autor de relatório citado por Bolsonaro

Corregedor do tribunal pede apuração sobre possível ‘manipulação da atividade fiscalizatória da Corte em razão de orientação política’

Lauriberto Pompeu / COLABORARAM VINÍCIUS NEDER, AMANDA PUPO, ADRIANA FERRAZ E BEATRIZ BULLA

O Tribunal de Contas da União afastou por 60 dias o auditor Alexandre Figueiredo Costa Silva, que produziu documento citado por Jair Bolsonaro para “comprovar” que cerca de metade dos óbitos registrados como covid-19 não seria causada pela doença. O TCU desmentiu o levantamento.

O Tribunal de Contas da União (TCU) afastou do cargo por 60 dias o servidor que produziu um documento sobre mortes na pandemia do novo coronavírus. O pedido foi feito pelo corregedor do tribunal, ministro Bruno Dantas, e aceito pela presidente, ministra Ana Arraes. Além do afastamento, o auditor Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques está proibido de entrar no prédio do órgão. O caso será enviado à Polícia Federal para que seja aberto um inquérito para apurar sua conduta.

O levantamento não oficial feito por Marques aponta “supernotificação” de mortes por covid-19 no País. O relatório foi inserido no sistema do TCU sem que constasse de qualquer processo do órgão. Esse documento foi citado na segunda-feira passada pelo presidente Jair Bolsonaro para “comprovar” a tese de que cerca de metade dos óbitos registrados como covid19 não seria causada pela doença. O tribunal de contas o desmentiu no mesmo dia.

Dantas afirmou que o afastamento é necessário para que o auditor não influencie nas apurações. O servidor está impedido de acessar o sistema eletrônico do tribunal. “Mais grave, e isso precisará ser melhor apurado, é a manipulação da atividade fiscalizatória do TCU em razão de orientação política ou ideológica”, disse o corregedor. “Se ficar comprovado que o auditor utilizou o cargo para induzir uma linha de fiscalização orientada por convicções políticas, será punido exemplarmente.”

Dantas sugeriu que a PF apure se houve prevaricação – atos contra a administração pública visando interesse pessoal.

Marques é auditor do TCU desde 2008 e é próximo de três filhos de Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-rj), o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-rj). Seu pai é amigo do presidente (mais informações nesta página). Marques disse a sua chefia que seu pai forneceu os dados para Bolsonaro. Ontem, Flávio afirmou que não se lembra de conhecer o auditor. “Não lembro quem é essa pessoa, de nome assim eu não estou lembrado”, disse o senador ao ser questionado sobre o assunto em Washington.

Em 2019, Marques foi indicado – com ajuda de Eduardo Bolsonaro – para uma diretoria do BNDES. A nomeação, porém, foi barrada pelo então presidente do TCU, José Múcio, que alegou que o regimento interno da Corte não permitiria a mudança.

Nascido no Rio, o auditor mora desde 2015 em Jundiaí (SP). É casado com Nara de Pieri, filha do vereador paulistano Eliseu Gabriel, filiado ao PSB, partido de oposição a Bolsonaro. O vereador o classificou como “trabalhador” e “patriota”, não “bolsominion”. “Ele estava estudando se existia subnotificação ou sobrenotificação dos casos. Era um debate interno.”

Senado. A CPI da Covid aprovou ontem a convocação de Marques. O requerimento foi apresentado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-se) “para esclarecer detalhes de sua participação na elaboração de ‘estudo paralelo’”. Procurado, Marques não quis se manifestar.

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2021-06-10T07:00:00.0000000Z

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