Buffet pago pela Contag só tem placa de telefone na porta
Empresa que recebeu verba de entidade investigada por suspeita de fraudes no INSS não funciona no endereço indicado
DANIEL WETERMAN
Um buffet que recebeu dinheiro de um sindicato investigado na fraude do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) fica em um endereço em Brasília com as portas fechadas e tem apenas um cartaz com o nome e o telefone colado do lado de fora. A Polícia Federal suspeita que essa e outras empresas tenham recebido valores desviados da folha de pagamento de aposentados.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) é uma das entidades investigadas por descontos indevidos em aposentadorias e pensões do INSS. Em nota, a entidade afirmou que “não praticou nenhuma irregularidade em relação ao processamento de descontos de mensalidades associativas nos benefícios previdenciários concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)”.
“Inclusive, a Contag denunciou ao INSS, por duas vezes, descontos indevidos e práticas abusivas contra aposentados e pensionistas rurais”, diz o comunicado. A defesa do buffet não respondeu.
O esquema levou à queda do agora ex-ministro da Previdência Social Carlos Lupi e do então presidente do instituto, Alessandro Stefanutto, além do afastamento de outros dirigentes. Há suspeitas de lavagem de dinheiro e recebimento de propina por parte de servidores do órgão.
Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou a saída de R$ 26,5 milhões da Contag para 15 contas de outros sindicatos, empresas e pessoas físicas de forma fracionada.
Desse valor, R$ 737,9 mil foram para a Tuttano Culinária Artesanal Ltda., empresa aberta em 2021 que declara oferecer serviço de alimentação e buffet na capital federal. Chamou a atenção da PF o fato de a firma ter sido fundada na época em que a Contag começou a aumentar o faturamento com os descontos do INSS.
O Estadão foi até o local onde fica a sede do buffet, no Núcleo Bandeirante, região administrativa do Distrito Federal, a cinco quilômetros da sede da Contag. Na tarde da última quarta-feira, o local estava fechado. Um papel identifica empresa e um telefone estava fixado.
A reportagem telefonou para o número informado, mas os responsáveis não quiseram dar entrevista e passaram o contato de um advogado. A defesa não respondeu aos pedidos da reportagem. Vizinhos relataram que não há atendimento nem movimento intenso, apenas entrada e saída de pessoas para pegar equipamentos e materiais de trabalho.
DONO. O dono do buffet é André Guimarães, segundo relatório da PF. A Tuttano foi aberta no nome do filho dele. André tem outro CNPJ de alimentação e eventos na loja ao lado, a Inovah Locação de Materiais, Buffet e Organizações de Eventos Eireli, que também estava fechada e com o número de telefone colado na porta.
As duas empresas usam o mesmo nome fantasia: Andre Gourmet Buffet. Nas redes sociais, há fotos de eventos e a última publicação é de janeiro de 2024. Uma firma foi inaugurada em 2013. A outra, que recebeu dinheiro da Contag, foi aberta em 2021, e a PF suspeita de que esta tenha sido usada para movimentar dinheiro desviado da associação.
Durante busca e apreensão, a PF constatou que não havia sinal de funcionamento do buffet no local. Segundo a investigação, o valor recebido pela empresa foi fracionado e transferido para outros dez beneficiários, incluindo R$ 840 mil para um professor da rede pública do Distrito Federal e R$ 172 mil para uma pessoa que tem um salário de R$ 1,7 mil, ou seja, uma renda incompatível com a quantia recebida. Outro fato
Defesa Em nota, Contag afirma que não praticou qualquer irregularidade; empresa não respondeu
foi alertado: a Tuttano não só recebeu dinheiro da Contag como transferiu R$ 453 mil para o mesmo sindicato. Para os investigadores, os valores transferidos pela Contag para o buffet em Brasília e outras empresas entre 2021 e 2024 não têm justificativa aparente e indicam possível desvio dos valores das mensalidades descontadas dos aposentados. •
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2025-05-06T07:00:00.0000000Z
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