O Estado de S. Paulo

Câmara aprova barreira a supersalário no funcionalismo

Vencimentos terão de ser limitados ao teto de R$ 39,2 mil, com limite de ‘penduricalhos’; texto vai ao Senado

Vinícius Valfré Camila Turtelli

A Câmara aprovou projeto que limita os vencimentos dos servidores ao teto equivalente ao salário de um ministro do STF, de R$ 39,2 mil. O texto, que abrange o funcionalismo dos três Poderes e inclui militares, é considerado importante barreira a privilégios históricos de uma elite de servidores. Hoje, embora exista, o teto de vencimentos é frequentemente superado por “penduricalhos”, como diversos tipos de auxílios. Em todo o País são mais de 500. Pelo projeto, apenas 32 poderão superar o limite constitucional. O projeto traz uma lista do que será classificado como verba indenizatória e poderá ser pago sem prejuízo do teto remuneratório. Segundo o relator da proposta, deputado Rubens Bueno (Cidadaniapr), a economia para os cofres públicos será de R$ 3 bilhões por ano. O texto vai ao Senado. Se for aprovado, será submetido à sanção do presidente Jair Bolsonaro.

A Câmara aprovou ontem um projeto que impõe barreiras ao pagamento de “supersalários” recebidos pelo funcionalismo público, incluindo servidores do Judiciário. O texto estabelece limitação a privilégios historicamente repassados a uma elite de servidores, que gozam de condições incompatíveis com a realidade dos demais trabalhadores do País. O projeto também alcança civis e militares dos três Poderes.

Hoje, embora exista um teto remuneratório equivalente ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), de R$ 39,2 mil, esse patamar costuma ser “fictício”, porque os vencimentos abrangem “penduricalhos”, como auxílio-livro, auxílio-moradia e auxíliobanda larga e tantos outros, fazendo com que os ganhos mensais estourem o teto. São esses benefícios que foram atacados no projeto aprovado ontem.

O texto, que foi alterado na Câmara, será novamente apreciado pelo Senado. Caso seja aprovado sem alterações e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro, as regras passam a valer imediatamente.

Em todo o País, são mais de 500 tipos de benefícios concedidos a servidores. Após sanção, apenas 32 poderão superar o limite constitucional. As mudanças estipulam, por exemplo, que o auxílio-creche poderá ter valor de até 3% do salário máximo pago a um servidor, o que equivale a R$ 1,178 mil. Foi ainda limitada a “venda” de férias a 30 dias por exercício. A medida atinge em especial magistrados e integrantes do Ministério Público que têm direito a 60 dias de férias e recebiam o adicional de férias nos dois períodos.

O auxílio-moradia, muito utilizado em Brasília, por exemplo, poderá ultrapassar o teto, desde que siga regras como ser concedido quando o servidor é obrigado a se mudar de cidade por causa do trabalho. A matéria também aplica uma “trava” para alguns benefícios, como o auxílio-alimentação, que poderá exceder o teto, mas em valor limitado a, no máximo, 3% do salário do servidor.

As verbas de natureza indenizatória, grosso modo, que não são o salário em si, não sofrem descontos, mesmo quando a soma dos ganhos ultrapassa o teto. Ao longo dos anos, representações de servidores trabalharam para que benefícios desse tipo fossem incorporados. São um caminho para aumentar os pagamentos sem descumprir legislações. O projeto mexe justamente nessas condições.

Os casos de “supersalários” Brasil afora são muitos. É um tema recorrente nos âmbitos estadual e federal do Poder Judiciário. Em 24 Estados, juízes recebem por mês mais de R$ 1 mil de vale-refeição. Em Pernambuco, o valor chega a R$ 4,7 mil – o montante supera o dobro da renda média do brasileiro.

Casos. Em uma nota técnica sobre o projeto aprovado na Câmara, o Centro de Liderança Pública listou outros casos emblemáticos de remunerações extra-teto. Entre eles, os R$ 543 milhões pagos a juízes e procuradores como benefícios durante a pandemia, o fato de uma juíza de Pernambuco ter recebido R$ 1,3 milhão em 2019 e, ainda, o caso de um juiz de Minas Gerais que ganhou mais de R$ 700 mil somente com verbas indenizatórias.

O texto aprovado na Câmara traz uma lista do que pode ser classificado como verba indenizatória e pode ser pago sem prejuízo do teto remuneratório. O que estiver fora dessa lista, deve ser pago com desconto para que o limite seja respeitado.

Jetons. Ficam liberados da observância ao limite pagamentos como o adicional de férias de até um terço do salário, décimo terceiro salário, adicional noturno, adicional de insalubridade, entre outros. Entre as remunerações que passarão a ser consideradas para cálculo do teto, estão os “jetons”, como são chamadas as participações de ministros e servidores em conselhos de empresa pública. Hoje, o pagamento devido por essa participação em reuniões soma-se integralmente aos salários.

Estarão ainda sujeitos ao limite salarial do ministro do STF os “honorários de sucumbência”, verbas repassadas a algumas categorias de servidores por produtividade em processos judiciais. As mudanças também afetam pagamentos a promotores de Justiça, defensores públicos e juízes de Direito.

Para o relator da proposta, deputado Rubens Bueno (Cidadania-pr), o projeto combate os abusos contra o erário. “Quem é que admite privilégios? Não é o funcionalismo público. São grupos que atuam no serviço público e que tiram proveitos daquilo que a Constituição deixava como margem porque não havia sido regulamentado até agora por lei”, disse ele.

Segundo Bueno, ao se tornar lei, o projeto trará economia de R$ 3 bilhões por ano. O CLP considera que aproximadamente 25 mil servidores públicos tenham ganhos acima do teto. “Não é possível mais admitir que, por meio centenas de penduricalhos, uma pequena casta chegue a receber salários de mais de R$ 100 mil por mês. Barramos centenas desses auxílios, que agora não podem mais fazer com que os salários ultrapassem o teto”, disse Bueno.

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2021-07-14T07:00:00.0000000Z

2021-07-14T07:00:00.0000000Z

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