Como somar US$ 27 tri ao PIB brasileiro
Precisamos garantir a formação básica dos nossos alunos. E isso não é tão complicado. Basta executar o básico bem-feito
Jair Ribeiro EMPRESÁRIO, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO PARCEIROS DA EDUCAÇÃO, CURSA O PROGRAMA ADVANCED LEADERSHIP INITIATIVE NA UNIVERSIDADE HARVARD
Um novo estudo dos professores Eric Hanushek (Stanford), Ludger Woessmann e Sarah Gust, (Universidade de Munique), revela um dado impactante. Se todos os alunos brasileiros dominarem as competências básicas de aprendizagem, o Brasil pode somar US$ 27 trilhões ao PIB até o fim do século, em valor presente. Isso equivale a mais de oito vezes o PIB atual. Alcançar esse objetivo é plenamente possível, mas exige um foco absoluto da sociedade e do governo em fazer o básico bem-feito.
Desde que fundamos a Parceiros da Educação em 2004, o foco sempre foi apoiar os alunos com menor desempenho, buscando equidade e justiça social para que desenvolvam seu potencial. Esse novo estudo aponta agora uma forte justificativa econômica para a nossa caminhada.
Hanushek e Woessmann investigam há anos os fatores determinantes para a prosperidade econômica de longo prazo. Analisaram diversos elementos, como a força das instituições, a complexidade produtiva e o investimento em capital físico. Ao final, concluíram que o principal fator causal para o crescimento sustentável é a qualidade da educação, medida pelo nível de aprendizado dos alunos.
Para isso, compararam o desempenho em avaliações internacionais com o crescimento de dezenas de países ao longo de décadas. Identificaram que um aumento de 100 pontos (escala de 0 a 1,000) na média do Pisa – avaliação internacional da OCDE para alunos de 15 anos – está associado a um incremento permanente de dois pontos porcentuais anuais adicionais ao PIB per capita (Hanushek, Woessmann, 2012).
No novo estudo de 2024, os autores expandiram a análise original para 159 países, abrangendo 98% da população e do PIB global. Utilizaram avaliações internacionais e regionais, ajustadas para uma escala comparável à do Pisa – um trabalho extenso e tecnicamente robusto.
O estudo calculou, país por país, quantos jovens – dentro ou fora da escola – não conseguiram dominar as competências básicas de aprendizagem, definidas pelo nível 1 do Pisa em matemática (420 pontos) e ciências (410 pontos). Em seguida, os pesquisadores estimaram quantos pontos seriam necessários para que esses alunos atingissem essa marca e aplicaram a fórmula do estudo original para projetar o impacto sobre o PIB. Por fim, trouxeram esse montante para o valor presente, usando uma taxa de desconto de 3% ao ano.
O nível 1 representa o patamar mais básico de aprendizado. Em matemática, por exemplo, significa resolver problemas simples como localizar um número numa tabela, identificar o item mais barato ou calcular 10% de R$ 50. Bem básico.
No Brasil, 62% dos alunos matriculados não alcançaram esse nível em 2018, e outros 18% da mesma faixa etária estavam fora da escola. Esses índices pioraram ainda mais em 2022. No Chile, eram 44% e 11%; na China, 14% e 19%, respectivamente.
O resultado é impressionante: se todos os jovens brasileiros, incluindo os fora da escola, atingissem esse nível básico, o País ganharia US$ 27,8 trilhões em valor presente – mais de oito vezes o PIB atual! Em 2100, nosso PIB seria 80% maior do que o previsto no cenário base, colocando o Brasil entre os países com maior ganho na análise.
Vale um parêntese: alguns economistas, como Daron Acemoglu e James Robinson (MIT), questionam a causalidade entre educação e crescimento. Eles destacam o papel fundamental das instituições inclusivas, como proteção à propriedade e segurança jurídica. Já o professor Ricardo Hausmann (Harvard) chama atenção para a capacidade dos países aplicarem conhecimento em cadeias produtivas complexas, gerando maior valor agregado.
Hanushek e Woessmann não descartam essas abordagens, mas enfatizam a sua própria. Ao discutir o tema com Woessmann neste semestre em Cambridge, ele foi categórico: garantir as habilidades básicas é essencial. Sem isso, não se forma o capital humano necessário para sustentar instituições sólidas ou impulsionar a inovação. Aliás, essa relação causal entre educação de qualidade e desenvolvimento já era conhecida – vide os casos da Coreia do Sul, Cingapura, Finlândia e, mais recentemente, do Vietnã. A grande novidade do estudo foi quantificar precisamente esse impacto e destacar a importância das habilidades essenciais.
O estudo deixa claro: precisamos garantir a formação básica dos nossos alunos. E isso não é tão complicado. Basta executar o básico bem-feito, centrado em três pilares: bom material didático; professores bem formados e valorizados; e gestão escolar focada na aprendizagem. Essa abordagem já mostrou resultados concretos no Brasil e é defendida por entidades como o Todos Pela Educação e a Parceiros da Educação, que lidero.
O que falta mesmo para enfrentarmos esse problema é dar um foco absoluto ao resgate dessas crianças da escuridão do analfabetismo funcional. É inaceitável, em pleno século 21, permitir que tantos alunos continuem sem o mínimo necessário para avançar na escola e na vida. Como sociedade, é nosso dever mobilizar e apoiar os governos nessa causa urgente. Se antes era por equidade, que seja agora também pela lógica econômica. •
O ESTADO DE S. PAULO
pt-br
2025-04-25T07:00:00.0000000Z
2025-04-25T07:00:00.0000000Z
https://digital.estadao.com.br/article/281625311162182
O Estado
