O Estado de S. Paulo

‘BookTok’ cresce e leva jovens a curtir literatura

Literatura Mania Núcleo do TikTok bate os 14 bilhões de visualizações desde 2021, cria ‘clube do livro’ e conquista espaço próprio em livrarias

SABRINA LEGRAMANDI

Núcleo do TikTok atrai influenciadores como Leoni Lane (foto), tem alta visualização e até espaço nas livrarias.

Foi em meados de 2020 que o Tik Tok acrescentou, na plataforma, o BookTok, conteúdo sobre livros – e, no primeiro semestre de 2021, a novidade já tinha conquistado lugar de destaque no dia a dia da rede. Na contramão da habitual rotina de “rolar o feed”, um público jovem, em vez de virar páginas, passou a usar a rede social para falar de literatura, discutir questões sociais e incentivar o hábito da leitura.

Novo espaço Escritor e influenciador vê a tendência como um ‘fator geracional’ que abre espaço para os jovens

“Foi uma das melhores coisas que fiz. Criamos uma comunidade muito próxima, lá todo mundo se sente à vontade para ser quem é”

Leoni Lane

Criadora do BookTok

“Podemos fazer do BookTok um lugar para discutir livros voltados ao público jovem, numa linguagem mais próxima do público alvo” Tiago Valente

Escritor e influenciador

Os números são animadores, avisa Ronaldo Marques, líder de parcerias de conteúdo do TikTok Brasil. Segundo ele, a hashtag #booktokbrasil já teve aproximadamente 14 bilhões de visualizações. E a tag #booktok soma mais de 134,8 bilhões de visualizações, acrescenta Marques, enquanto o termo #booktoker tem 12,1 bilhões. A tendência já não se limita às telas: seções específicas para obras que viralizaram na plataforma já aparecem em algumas livrarias, indicadas pelos termos “BookTok” ou “Livros do TikTok”.

Acompanhando esse avanço, a plataforma busca também se aproximar de eventos e premiações do universo literário. Nesse sentido, já teve estandes na última Bienal do Livro de São Paulo e, no ano passado, transmitiu ao vivo a cerimônia do Prêmio Jabuti.

NOVAS PORTAS. Foi fora das telas que o BookTok invadiu o cotidiano de Leoni Lane, a sua criadora, que soma mais de 16 milhões de curtidas na rede social. Lembrando que seus pais a incentivaram a ler “desde que nasceu”, ela diz ter descoberto “um novo mundo dos livros” depois do TikTok. A ideia de criar um BookTok, revela Leoni, veio por um motivo específico: na falta de pessoas, ao seu redor, habituadas à leitura, ela começou a publicar conteúdos para comentar suas leituras. “A minha vida mudou. O BookTok abriu portas que eu nem sabia que existiam”, constatou.

Hoje, a influenciadora coordena um clube do livro em que reúne seguidores mensalmente para discutir sobre “os livros e a vida”. “Foi uma das melhores coisas que já fiz. Criamos uma comunidade muito próxima, lá todo mundo se sente à vontade para ser quem é”.

O conteúdo sobre livros também mudou os hábitos do escritor e influenciador Tiago Valente depois de o BookTok se tornar o seu trabalho. Com mais de 9 milhões de curtidas na rede, ele começou a criar conteúdos para a plataforma em 2017 com vlogs, vídeos de comédia e receitas. Depois que viralizou um vídeo em que resumia em 30 segundos o livro Dom Casmurro, de Machado de Assis, ele resolveu dedicar o perfil a conteúdos literários. Rapidamente, sua vida como leitor mudou por conta das trocas que o aplicativo lhe proporcionou.

Como escritor, Tiago também vê no TikTok a oportunidade de uma conversa mais direta entre leitores e autores brasileiros. “Ter um contato tão próximo com o autor de um livro que você acabou de ler é uma experiência única. Essa oportunidade fez com que mais leitores quisessem conhecer e se identificar com obras que falam sobre a nossa realidade”, menciona.

AUTORES. Após o crescimento do interesse de usuários da plataforma por literatura nacional contemporânea, Tiago percebeu uma maior inclusão de escritores do Brasil em catálogos e lançamentos. Segundo Ronaldo Marques, de fato, livros e autores brasileiros viraram sensação na plataforma.

A hashtag sobre a obra O

Amor Não é Óbvio, de Elayne Baeta, por exemplo, tem 25 milhões de visualizações. Outros livros, como Enquanto Eu Não Te Encontro, de Pedro Rhuas,

Conectadas, de Clara Alves, e

Jantar Secreto, de Raphael Montes, também são muito comentados. Também chamam a atenção as obras temáticas. É comum encontrar resenhas sobre romances LGBT+ e livros que trazem questões sociais, como racismo e machismo, em uma linguagem contemporânea.

Para Tiago, esse fenômeno pode se dever a um fator geracional. “O TikTok foi a plataforma onde vários leitores da Geração Z tiveram seu primeiro contato com a literatura e, consequentemente, trouxeram um olhar mais fresco e desconstruído para essas leituras”, diz. Em vídeo recente, ele debate uma pergunta que recebeu de um seguidor: “Você se considera um crítico literário ou um divulgador de conteúdo no TikTok?” O influenciador, que passou sete anos na universidade fazendo uma graduação e um mestrado em Letras, disse que a questão lhe causou uma “crise existencial”.

Ele diz ter percebido uma falta de prestígio da literatura jovem no ambiente acadêmico, já que, no tempo em que passou pela academia, não teve nenhuma matéria em que estudasse esse tipo de literatura. “Podemos fazer do BookTok um lugar para discutir e criticar livros voltados ao público jovem, aproveitando uma linguagem muito mais próxima ao público-alvo dessas histórias”, opina. •

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2023-05-15T07:00:00.0000000Z

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