Conexões políticas permeiam negócio entre Master e BRB
Banqueiro Daniel Vorcaro circula à direita e à esquerda no DF
DANIEL WETERMAN
As conexões do empresário Daniel Vorcaro nos círculos financeiro e político – à direita e à esquerda – contribuíram para que o Banco de Brasília (BRB), estatal do DF, se interessasse pela compra do Banco Master – de Vorcaro. A negociação ainda precisa passar pela aprovação do Banco Central e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Uma das pessoas mais próximas ao banqueiro em Brasília é o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP. Nogueira foi ouvido antes de o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), dar aval à oferta de compra do Master pelo BRB e é padrinho da indicação do atual presidente do Cade, Alexandre Cordeiro. As relações de Vorcaro – que não quis se pronunciar ao Estadão – levaram políticos a questionar a oferta do BRBpor um banco privado. A operação também movimenta a corrida pelo governo do DF em 2026.
O empresário Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, possui uma cartilha com sete princípios para guiar seus negócios. Um deles é se arriscar sempre – “não tomar risco já é um risco” – e outro é escolher as pessoas “com quem se conectar nessa jornada”. No mundo político, Vorcaro seguiu à risca a cartilha que ensina em palestras. Começou a fazer parte dos principais círculos, patrocinou eventos com ministros e banqueiros e hoje coleciona uma rede que inclui petistas e bolsonaristas.
Mais recentemente, as conexões no mercado financeiro e no mundo político levaram o BRB, o Banco de Brasília, estatal do Distrito Federal, a oferecer R$ 2 bilhões por 58% do capital total do banco de Vorcaro, sendo 49% das ações com direito a voto. A negociação ainda precisa passar pela aprovação do Banco Central e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Procurado pela reportagem, Daniel Vorcaro não quis se manifestar.
Uma das pessoas mais próximas a Vorcaro em Brasília é o senador Ciro Nogueira, presidente do PP e ex-ministro do governo Jair Bolsonaro (PL). De acordo com pessoas próximas ao parlamentar, Ciro foi ouvido antes de o governador
Segundo um dos princípios da cartilha do empresário, é importante saber ‘com quem se conectar’
do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), dar aval à oferta de compra do Master pelo BRB, e é peça-chave na negociação, pois Ibaneis busca apoio para a eleição de 2026, quando pretende se candidatar ao Senado. O grupo liderado por Ciro Nogueira, que inclui o presidente do União Brasil, Antônio Rueda, ofereceu uma aliança para pavimentar a campanha do atual governador do DF em 2026.
Ciro Nogueira é padrinho da indicação do atual presidente do Cade, Alexandre Cordeiro, um dos órgãos responsáveis por aprovar a venda do Master. O órgão considera a compra uma “operação simples”. Procurado, o senador não quis falar sobre o assunto. Ibaneis também não se manifestou.
O presidente do Banco Master participou de eventos e patrocinou encontros em que esteve ao lado de Ciro Nogueira, outros políticos e empresários. Os eventos são organizados pelo Grupo Esfera, que reúne empresários e políticos no Brasil e no exterior.
Procurado pela reportagem, o grupo Esfera Brasil informou que “os eventos são divulgados previamente, transmitidos pelas redes sociais do grupo e abertos à imprensa de forma transparente”. Ainda de acordo com o comunicado, “a escolha dos palestrantes e debatedores é realizada pela relevância da autoridade e notoriedade sobre os temas em pauta, sempre em linha com os objetivos da Esfera de promover debates que contribuam para a construção de um país melhor. Apartidária e independente, a Esfera Brasil é um think tank aglutinador do empreendedorismo brasileiro, promovendo diálogos entre empresas, governos e instituições e estimulando debates produtivos, de forma republicana”. •
Em um dos encontros com políticos e empresários, em outubro do ano passado, em Roma, Daniel Vorcaro deu uma palestra ao lado do senador Ciro Nogueira e disse que o governo precisava enfrentar o buraco fiscal das contas públicas, mas defendeu apoio à gestão Lula, expondo sua escolha de fazer acenos à esquerda e à direita. “A gente tem pauta de costumes, que eu acho que elas sempre vão existir, sejam de direita ou de esquerda; mas, como empresários, como sociedade, a gente tem de apoiar o governo e ver o lado bom do que tem sido feito”, disse o empresário.
Vorcaro também é próximo de Fábio Faria, ex-ministro de Bolsonaro que presta serviço desde 2023 ao banco BTG Pactual, que também estuda fazer uma proposta pelo Banco Master. Os dois se conheceram em janeiro do ano passado, durante almoço do Grupo Esfera em Brasília em homenagem ao procurador-geral da República, Paulo Gonet. Foi nesse período que o banqueiro intensificou suas viagens a Brasília. Faria não só manteve contato como também apresentou o empresário a outros políticos. Procurado, o ex-ministro não comentou a relação.
Pessoas próximas a Vorcaro o classificam como alguém afável e fácil de fazer amizades. O fato de ser um banqueiro novato na Faria Lima e nos círculos políticos mas ter tido uma ascensão rápida nos negócios e entre líderes partidários e autoridades ajuda a explicar um pouco essa impressão. Ele é citado como “uma das pessoas mais queridas” em Brasília por interlocutores.
OSTENTAÇÃO. Ao mesmo tempo, o empresário não deixa passar despercebido um perfil de ostentar riqueza com festas, camarotes e viagens. O banqueiro afirmou ter comprado o Fasano Itaim como pessoa física, é investidor do Clube Atlético Mineiro e fez uma festa estimada em R$ 15 milhões para os 15 anos da filha, que viralizou nas redes sociais.
Vorcaro passou a se juntar também com ministros e parlamentares aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O Master contratou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, e o exministro da Fazenda Guido Mantega como consultores antes de os dois serem indicados para os cargos no governo e na Eletrobras, respectivamente.
O banco de Vorcaro criou um espécie de comitê consultivo com figuras da política, do mercado financeiro e do Judiciário. Mantega levou o empresário para conhecer o presidente Lula, em Brasília.
O círculo de amizades do banqueiro com aliados de Lula inclui ainda o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e os empresários mineiros Walfrido dos Mares Guia (das áreas de educação e saúde), ex-ministro de Lula, e Lucas Kallas (do setor de mineração) – Vorcaro também é de Minas Gerais.
O baiano Augusto Lima, sócio dele no banco, por sua vez, é amigo do ministro da Casa Civil, Rui Costa, e do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).
Foi na época de Costa como governador da Bahia que Lima arrematou o Credcesta, programa de crédito consignado dos servidores públicos do Estado. Depois que privatizou o negócio que dava prejuízo, o atual ministro de Lula ampliou as possibilidades do programa. O programa foi o responsável pelo impulso inicial do Master em 2019. Lima e Costa também foram procurados, mas preferiram não se manifestar.
Entre 2023 e 2024, sob o governo Lula, Vorcaro esteve três vezes na sede da Presidência da República, de acordo com os registros de entrada mantidos pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI): nos dias 4 de dezembro de 2023, 1.º de março de 2024 e 3 de abril de 2024. Na primeira vez, Vorcaro entrou na mesma hora e no mesmo minuto que Lucas Kallas, sócio de Walfrido. Nas duas primeiras datas, Lula estava em viagem.
O Planalto afirmou que não houve agenda do presidente da República e de nenhum servidor do gabinete de Lula com Vorcaro. No entanto, pessoas próximas ao banqueiro e ao presidente confirmaram ao Estadão que o encontro ocorreu, mas fora da agenda oficial do chefe do Executivo.
QUESTIONAMENTOS. As relações de Vorcaro levaram políticos a questionar a oferta do BRB, um banco estatal, por um banco privado. A operação também já movimenta a corrida pelo governo do Distrito Federal em 2026. Presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Ricardo Cappelli, que foi interventor federal na segurança pública do DF após o 8 de Janeiro, classificou a operação como “uma das maiores negociatas do País”. Ele é pré-candidato ao Palácio dos Buritis em 2026.
Na última semana, parlamentares acionaram o TCU, o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), o Ministério Público e o Senado para fiscalizar a negociação. O negócio mobilizou tanto aliados de Ibaneis como opositores, que veem uma chance de se cacifar na disputa por cargos majoritários no ano que vem.
“Nós fomos surpreendidos com essa notícia como qualquer cidadão e deveríamos no mínimo ter sido comunicados”, disse a senadora Damares Alves (Republicanos-DF). Ela e os outros dois senadores do DF, Izalci Lucas (PL) e Leila Barros (PDT), se reuniram com o presidente do BC, Gabriel Galípolo, para cobrar uma análise rigorosa da operação.
Procurado pela reportagem,
Relações de Vorcaro levaram políticos a questionar a oferta do BRB por um banco privado
o BRB disse em nota que “a decisão de adquirir participação no Banco Master foi conduzida de forma estritamente técnica, alinhada ao plano estratégico da instituição, e amplamente respaldada por instâncias legais, jurídicas e de governança”.
O Banco de Brasília afirmou ainda que a Procuradoria-Geral do Distrito Federal confirmou, por meio de parecer de 17 de março de 2025, que não há necessidade de autorização por parte da Câmara Legislativa do DF para a operação, um entendimento diferente de técnicos do órgão legislativo. A competência para a decisão é do conselho de administração do BRB, segundo o parecer levado ao BRB.
“Não houve qualquer interferência externa, seja de autoridades políticas do DF ou de figuras do cenário nacional, no processo de decisão da operação”, afirmou o banco. •
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