O Estado de S. Paulo

Por dentro do futuro prédio mais alto de SP

‘Estadão’ visitou a Torre Alto das Nações, em Santo Amaro, ao lado do Rio Pinheiros, que será também o maior edifício de escritórios do País

PRISCILA MENGUE

Torre Alto das Nações, em Santo Amaro, terá 219 m de altura, mirante de 360° e será o edifício de escritórios mais alto do País.

Discretamente, um novo recorde foi ultrapassado em São Paulo: o de prédio mais alto da cidade. O edifício ainda em construção não apenas bateu o antigo maior arranha-céu (já tem 194,7 metros de altura) como será o primeiro a transpor a marca de 200 metros, o que deve ocorrer em algumas semanas. Com exclusividade, o Estadão visitou as obras do novo recordista paulistano: a Torre Alto das Nações. A construção integra um complexo multiúso homônimo no distrito de Santo Amaro, junto ao Rio Pinheiros, na zona sul. Quando pronto, será o maior edifício de escritórios do País (os arranha-céus de Balneário Camboriú são residenciais).

O edifício chegará a 219 metros por volta de julho, com acabamento até o fim do ano. Ele terá quase 50 metros a mais do que o atual recordista, o Platina 220, do Tatuapé, na zona leste, que tem 171,7 metros. Perto do topo, estará um mirante com vista 360º da cidade e uma “caixa de vidro suspensa”, que se projetará para fora. Esse cubo transparente seguirá o exemplo de pontos turísticos conhecidos de Chicago, nos EUA, e do paulistano Sampa Sky, no centro.

A obra é realizada 24 horas, em diversas frentes simultâneas. O transporte dos painéis de alumínio e vidro da fachada (de 4,6 x 1,25 m e 130 kg) ocorre especialmente à noite e de madrugada. Além disso, pelas dimensões não tão usuais no mercado imobiliário paulista, a construção envolve especificidades.

Um elemento-chave é o vento, por exemplo, que implica interrupções da obra quando chega a 40 km/h e também exige que o prédio seja imperceptivelmente “flexível”. Outro aspecto é o transporte de trabalhadores e materiais até os pavimentos mais altos. Para tanto, foram instalados quatro elevadores temporários externos (chamados cremalheiras) e três gruas, que suportam até 5 toneladas.

O prédio é construído no antigo endereço do primeiro Carrefour brasileiro, na Avenida das Nações Unidas, na região do eixo corporativo da Avenida Chucri Zaidan. A multinacional integra o projeto do complexo – dividido em fases.

Dessa forma, o Paseo Alto das Nações (hipermercado e lojas, em estilo mall) e uma torre foram entregues no fim de 2022. Já o arranha-céu deve ser entregue na próxima etapa, enquanto o teatro e um edifício residencial ficarão para o momento posterior.

A incorporação envolve a WTorre, com projeto do escritório Jonas Birger Arquitetos, especializado em edifícios. No desenho, optou-se pela “pele de vidro” e linhas retas, que formam ângulos com formatos “tridimensionais”.

Além disso, estão sendo ins

“Vai ser um marco. É um elemento diferente, que permite descobrir a cidade de outro ângulo”

“(O rio) já foi pior, e a tendência é que esteja melhor”

Marco Siqueira CEO da WTorre

taladas duas jardineiras na parte externa (com plantas de raízes resistentes ao vento). Essa vegetação trará duas “linhas verdes” à fachada.

O principal arranha-céu terá subsolo, quatro “sobressolos” de garagem, térreo (com pé-direito de 8,5 m), 39 andares de lajes corporativas, mirante e heliponto. Quando pronto, terá mais de 30 elevadores para dar vazão ao fluxo de frequentadores e trabalhadores.

O mirante será aberto ao público também à noite e nos fins de semana. A avaliação é de potencial para atrair tanto paulistanos quanto turistas em busca de uma vista para diferentes pontos da cidade, como as represas e a região da Avenida Paulista.

Segundo Marco Siqueira, CEO da WTorre, o novo recordista entre os edifícios paulistanos está 100% vendido para investidores, mas ainda não há definição sobre a multinacional “âncora” que deve alugar grande parte da torre.

Ele avalia que essa posição terá também status simbólico para a futura ocupante. “( Estar no prédio) vai ser uma projeção da qualidade da empresa de certa forma. Ali, expressa uma imagem”, avalia.

PREVISÃO DE 10 MIL PESSOAS. Na avaliação do porta-voz da WTorre, pode-se estimar que seria mais barato construir duas torres para alcançar a mesma área construída. Não se teria, contudo, a mesma visibilidade, tampouco o perfil de empreendimento almejado pelo empreendimento.

Siqueira avalia que o novo arranha-céu vai “coroar” a transformação do entorno do Pinheiros. “Vai ser um marco. É um elemento diferente, que permite descobrir a cidade de outro ângulo”, afirma.

A previsão é de que 10 mil pessoas circulem diariamente no edifício, volume que deve ser ainda maior ao ser somado com o restante do complexo. “Edifícios altos no mundo inteiro têm sua atratividade. Se for no Chile, vai ouvir falar das torres altas de Santiago ( o recordista tem 300 metros). Na Argentina, de Puerto Madero ( o maior tem 235 metros). São Paulo carecia”, completa. Depois do Tatuapé se destacar nessa “corrida pelas alturas”, com edifícios de torres únicas e abertos ao entorno, o novo recordista na cidade é parte de um complexo.

O novo empreendimento, Alto das Nações terá, portanto, construções e usos variados, desde moradia e escritórios até opções de entretenimento, compras e gastronomia, com movimentação em todos os dias da semana e turnos. De acordo com Siqueira, o entorno do complexo passa por outras transformações significativas. Ele cita como exemplo o Parque Global, outro grande empreendimento de arranhacéus, localizado no outro lado do rio, assim como possíveis projetos de transformação no Pinheiros em si. “A ciclovia se consolidou. No futuro próximo, pode ter uma hidrovia. Por que não?”

O CEO não vê rejeição à proximidade com o rio. Para ele, é o oposto: com localização valorizada, próxima de outros endereços de multinacionais. “( O rio) já foi pior, e a tendência é que esteja melhor”, diz.

Já o tempo em que o recorde de altura permanecerá em vigor é uma incógnita para o porta-voz da WTorre. Enquanto o Mirante do Vale, no centro, foi o recordista por décadas, o Platina 220, por sua vez, esteve na dianteira apenas desde 2022. Siqueira analisa que um terreno que comporte um prédio com essas dimensões (considerando legislação e outras restrições) não é tão comum em áreas valorizadas, mas reconhece que esse tipo de construção

tem chamado a atenção no mercado. “Não é algo não factível de fazer ( um prédio maior).”

PARA RESISTIR AO VENTO. Segundo o diretor de Engenharia da WTorre, Walter Genovez, a média construtiva é de 2,5 pavimentos por mês. “A altura é um desafio que a gente vence todo dia, chuva, vento, logística”, completa.

Por isso, antes da obra, na fase de projeto, foi feito estudo de túnel de vento com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). “Geralmente, a estrutura é projetada de forma estática. Mas a gente sabe que, em uma condição desta aqui, inserido em um terreno muito grande e com os vizinhos afastados, ( o vento) tem um impacto”, afirma Guilherme Margara, gerente de Projetos da WTorre. “A fixação e a robustez das peças têm de atender a todo esse esforço.”

Dessa forma, foi avaliado o impacto direto do vento sobre a pele de vidro e, consequentemente, a estrutura. “Quando faz a fixação das esquadrias, têm de ter um pequeno intervalinho, uma distância entre um painel e outro que suporte ter esse jogo do vento, porque ele vai e volta”, completa. “E a estrutura suporta essa pequena flexibilidade.”

CIDADE DE ARRANHA-CÉUS?

Como o Estadão mostrou, embora tenha diversos bairros verticalizados, São Paulo não é uma cidade de arranha-céus como outras pelo mundo. O Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística (IBGE) aponta que a maioria da população de São Paulo vive em imóveis horizontais.

Na prática, especialistas dizem que a cidade tem grande número de construções verticais para os padrões nacionais, mas não tão altas; e grande parte dos bairros é majoritariamente baixa. Além disso, os arranha-céus paulistanos não têm estatura tão expressiva na comparação com cidades dos Estados Unidos e da Ásia.

Entre especialistas, há opiniões positivas e negativas. Despontar como referência em arranha-céus não significaria, necessariamente, melhoria na qualidade urbana; e há quem aponte possíveis impactos negativos no entorno. Além disso, entende-se que é um tipo de empreendimento de nicho para o altíssimo padrão. Mesmo assim, pelo tamanho, tem influência expressiva na paisagem.

O Council on Tall Buildings and Urban Habitat (Conselho sobre Edifícios Altos e Habitat Urbano; CTBUH na sigla em inglês) apresenta São Paulo como a 76.ª cidade mais vertical do mundo, o que considera só edifícios com 150 metros de altura ou mais. De acordo com a organização, 210 cidades em 41 países têm prédios com ao menos 200 metros – Balneário Camboriú, em Santa Catarina, é a única brasileira da lista.

A distribuição dos arranhacéus paulistanos é concentrada em três pontos: centro (construções mais antigas, dos anos 1940 a 1960), zona sul (entorno dos polos de negócios da Marginal do Pinheiros) e zona leste (Tatuapé). No setor, avalia-se que o nicho dos arranha-céus se alterou após a desaceleração entre os anos de 1970 e 2000. Um exemplo é a destituição do recorde de mais alto da cidade, em 2022, pelo Platina, após 55 anos de liderança pelo Mirante do Vale (também chamado de Palácio W. Zarzur).

Todos os projetos oficialmente anunciados até o momento para São Paulo não se aproximam, contudo, da altura dos gigantes mundiais. Segundo o CTBUH, prédios considerados “superaltos” precisam ter ao menos 300 metros, enquanto os “mega altos” têm 600 metros ou mais.

O atual recordista mundial é o Burj Khalifa, em Dubai, com 828 metros, mas há projetos no Kuwait e na Arábia Saudita que buscam ultrapassá-lo. No Brasil, o principal arranha-céu é a torre 2 do Yachthouse by Pininfarina Tower, com 294,1 metros, em Balneário Camboriú.

Vista da capital

Mirante 360° será uma ‘caixa de vidro suspensa’, que se projetará para fora do edifício

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