Lula cobra de outros poderes ‘cumplicidade’ para cortar gastos
AUDRYN KAROLYNE
“Quero saber se estão dispostos a fazer corte naquilo que é excessivo”, disse, ao referirse ao Judiciário e Legislativo.
Em entrevista a podcast apresentado por senadores, presidente afirma também que vai vencer ‘gana especulativa’ do mercado e desconversa sobre relações com Venezuela e EUA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cobrou “cumplicidade” dos Poderes Legislativo e Judiciário no esforço de medidas para o corte de gastos e disse que vai vencer “outra vez” a “gana especulativa do mercado financeiro”. O presidente afirmou que essa investida pelo ajuste fiscal deve contar com a participação do Congresso e de empresários.
“Se eu fizer um corte de gasto para diminuir a capacidade de investimento do Orçamento, a pergunta que eu faço é a seguinte: o Congresso vai aceitar reduzir as emendas de deputados e senadores para contribuir com o ajuste fiscal que eu vou fazer? Porque não é só tirar do orçamento do governo. Os empresários que vivem de subsídio do governo vão
“Quero saber se (os outros Poderes) estão dispostos a fazer corte naquilo que é excessivo, porque aí fica uma parceria e uma cumplicidade” Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente
aceitar abrir mão um pouco de subsídio para a gente poder equilibrar a economia brasileira? Eu não sei se vão aceitar”, afirmou Lula, em entrevista ao podcast PODK Liberados, apresentado pelos senadores Jorge Kajuru (PSB-GO) e Leila Barros (PDT-DF).
A entrevista foi gravada na última quarta-feira e exibida pela RedeTV! e no YouTube na noite de domingo. Lula afirmou ainda que o tema é “uma responsabilidade do Poder Executivo” e “é uma responsabilidade do Poder Judiciário”. “Quero saber se estão dispostos a fazer corte naquilo que é excessivo, se o Congresso está disposto também a fazer um corte nos gastos, porque aí fica uma parceria e uma cumplicidade para o bem, para que todo mundo faça o sacrifício necessário para a gente colocar a economia em ordem.”
A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), assinou uma carta em nome do partido que critica cobranças por cortes de gastos (mais informações nesta página).
MERCADO E RURALISTAS.
Em outro tema de sua entrevista, o presidente voltou a provocar o mercado financeiro, afirmando que vencerá a “gana especulativa”. “Eu vejo o mercado falar bobagem todo o dia. Sabe, eu não acredito nisso, não, porque eu já venci eles uma vez e vou vencer outra vez. A economia vai dar certo porque o povo está participando do crescimento desse país”, declarou.
“Conheço bem o discurso do mercado, conheço a gana especulativa do mercado, e eu às vezes acho que o mercado age com uma certa hipocrisia para tentar criar confusão na cabeça da sociedade”, continuou o petista.
O presidente afirmou também que não é mais considerado o inimigo da bancada ruralista no Congresso. “Eles estão ficando mais sustentáveis e ambientalistas. Correm o risco de não conseguir vender sua soja, vender sua carne”, afirmou o petista. “O agronegócio nunca recebeu tanto dinheiro quanto no governo desse ‘comunista’, que eles tratam assim”, disse Lula.
Além da bancada ruralista, a relação com o Congresso como um todo melhorou, segundo o presidente. “Vocês nos ajudaram a chegar aonde chegamos”, disse Lula, aos dois senadores. “Estamos aprovando tudo.” Ele ressaltou ainda que vê como normal o fato de algumas propostas serem rejeitadas pelos parlamentares.
VENEZUELA E EUA.
Ao falar de um tema que causa forte desgaste ao seu governo, o presidente procurou se esquivar e disse que a ditadura de Nicolás Maduro “é problema da Venezuela, não do Brasil”. “Não posso ficar me preocupando em brigar com Nicarágua e Venezuela, preciso brigar para fazer esse país dar certo”, afirmou.
Assim como a Venezuela, a Nicarágua vive uma ditadura, sob o comando de Daniel Ortega. Lula disse que não cabe a ele questionar a Suprema Corte de outro país, em referência à instância máxima do Judiciário da Venezuela, que avalizou a reeleição de Maduro nas eleições de julho, apesar das denúncias de fraude. “Quero que a Venezuela viva bem, e eu vou cuidar do Brasil.”
O presidente também afirmou que pretende manter uma relação de chefe de Estado com o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, a despeito das diferenças políticas com o republicano. “Não cabe a mim gostar de Trump, cabe entender que o povo americano foi soberano para eleger seu presidente”, afirmou. “Espero que Trump trabalhe pela paz e pelo povo americano, e espero ter uma relação civilizada”, disse Lula.
“Temos relação histórica com os Estados Unidos e queremos manter”, prosseguiu o petista, ao relembrar os bons contatos que manteve com George W. Bush e Barack Obama durante os dois mandatos anteriores, entre 2003 e 2010.
Sobre a recriação dos ministérios da Cultura e da Igualdade Racial, que haviam sido extintos na gestão de Jair Bolsonaro (PL) e de Michel Temer (MDB), respectivamente, o presidente defendeu a volta das pastas. “Estamos construindo isso porque achamos necessário. Durmo tranquilo com a certeza de que vamos consertar esse país.”
APOSTAS.
Ele defendeu ainda uma legislação rigorosa para as bets e citou denúncias de manipulação de resultados de jogos de futebol contra atletas brasileiros. “Não é possível que a gente tenha manipulação na sociedade brasileira”, disse o presidente durante a entrevista. “Esses meninos que estão jogando no exterior não têm que entrar em falcatrua. Também está em jogo que tipo de ser humano queremos”, declarou. •
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