O Estado de S. Paulo

Proposta quer mudar Código Civil para deter aplicativos de locação temporária

Grupo de juristas entrega ao Senado plano de revisão da legislação civil para que atividade só possa existir se aprovada pelo condomínio; Airbnb e Booking.com reagem

CLAYTON FREITAS

A novela que opõe donos de imóveis a favor e contra a locação para curta temporada, tais como as feitas pelos aplicativos Airbnb e Booking.com, pode ganhar um novo capítulo com uma proposta de revisão do Código Civil entregue por um grupo de juristas ao Senado.

Isso porque o trecho de um dos artigos estabelece que essa atividade só poderia existir se fosse aprovada pelo condomínio (mais informações nesta página). Hoje, essa obrigatoriedade não existe. O entendimento para quem tem imóveis locados nessa modalidade é a de que a medida irá dificultar e, em alguns casos, inviabilizar a atividade. Já quem é contrário comemora e torce para que o texto siga adiante o quanto antes e seja aprovado, algo que ainda não tem data para acontecer. Só para se ter uma ideia, o texto da última atualização do Código Civil, o de 2022, foi entregue por juristas em 1975.

Independentemente de quando (e se) entrará em vigor, a proposta já suscita debates. A advogada Kelly Durazzo, proprietária de dois imóveis disponibilizados para locação temporária via Airbnb, defende a necessidade de regulamentação, mas não da forma como foi proposta. “Vai suscitar muitas dúvidas. Já existe uma tonelada de decisões na Justiça do Brasil inteiro (permitindo e proibindo). Criará uma insegurança jurídica”, avalia.

Os imóveis de Kelly ficam na Vila Olímpia e Brooklin, na porção mais abastada da zona sul paulistana. A diária em cada um deles custa de R$ 210 a R$ 250, valor que pode variar para mais ou para menos dependendo da demanda. “Eu sempre aluguei. Depois que foi para o Airbnb, triplicou de valor”, diz ela, também docente do Insper e presidente da comissão de loteamento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB, seção São Paulo).

Nas palavras do síndico profissional Paulo Mujano, favorável à mudança, a medida “acaba com o Airbnb”. “Será a faca e o queijo nas mãos de todo mundo que quer acabar com o Airbnb”, diz. Ele administra 15 condomínios nos bairros de Higienópolis, Jardins e Bela Vista, sendo 13 deles de alto padrão. “A grande questão é a segurança. Não tem horário de entrada, saída, e algumas pessoas fazem festas. Nenhum condomínio tem capacidade para ser um hotel, e não é essa a sua finalidade”, diz.

Como não pode proibir o Airbnb, a solução que Mujano encontrou foi criar regras rígidas e incluí-las no regulamento interno, que preveem proibição de entrada fora do horário comercial e aviso, com 24 horas de antecedência, que deve ser acompanhado de um termo assinado pelo proprietário e com firma reconhecida em cartório. “As regras dificultaram e geraram desinteresse do proprietário para esse tipo de locação. Caiu 80% a locação pelo Airbnb”, diz.

APLICATIVOS. No meio das discussões, estão os aplicativos. “O aluguel por temporada no Brasil é legal, previsto na Lei do Inquilinato. Proibir ou restringir a locação por temporada viola o direito constitucional de propriedade de quem aluga o seu imóvel”, diz o Airbnb em nota.

Procurado, o Booking.com disse operar de acordo com as legislações de cada mercado em que oferece os seus serviços. “Ao redor do mundo, estamos monitorando discussões em torno de aluguéis de curta temporada, avaliando as implicações de possíveis novas leis e nos adaptando a mudanças de legislação sobre o tema”, diz, também em nota encaminhada por sua assessoria.

Além das plataformas, hoje existem diversas empresas que fazem a intermediação entre o dono de imóvel, inquilino temporário e os aplicativos. É o caso de Rômulo Vilela, do Canal do Anfitrião. “Alguns prédios proíbem a prática de curta duração, e entendem que se assemelham a hotelaria. Porém, na lei de locações já existe a previsibilidade de (poder locar) de 1 a 90 dias”, afirma.

“A grande questão é a segurança. Não tem horário de entrada, saída, fazem festas. Nenhum condomínio tem capacidade para ser um hotel, e não é essa a sua finalidade”

Paulo Mujano Síndico profissional

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2024-08-18T07:00:00.0000000Z

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