O Estado de S. Paulo

Legalização da maconha ganha apelo populista no Quênia

George Wajackoyah tem poucas chances de vencer a eleição, mas sua promessa faz a África acompanhar de perto a discussão

RACHEL CHASON RAEL OMBUOR • TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

O candidato à presidência rebolou e encolheu os ombros dançando ao som do reggae que bombava no ônibus de campanha. Enquanto George Wajackoyah dançava, a plateia entoava um verso da canção que se tornou jingle: “Sim, sou plantador de maconha”, sucesso de Marlon Asher.

Quando Wajackoyah, de 62 anos, pegou o microfone na cidade de Tala, perto de Nairóbi, falou sobre acabar com a corrupção, melhorar a economia e reduzir a dependência da China. Mas a promessa mais aplaudida foi a mais simples. “Maconha, maconha, maconha”, gritou Wajackoyah. A plateia levantou os punhos e respondeu: “Maconha, maconha, maconha”.

A eleição no Quênia, dia 9, será uma disputa entre dois políticos tradicionais – o ex-premiê Raila Odinga e o vice-presidente William Ruto –, que estão empatados nas pesquisas. Wajackoyah poderia, no máximo, obter votos para forçar um segundo turno entre eles.

LOUCO. Críticos desprezam Wajackoyah, professor de direito e advogado, qualificando-o como insano ou imoral. Mas, durante a campanha, marcada pela desilusão com o status quo, até mesmo seus rivais concordam que ele agitou a disputa.

“O que Wajackoyah fez foi trazer a discussão sobre a legalização da maconha para o primeiro plano”, afirmou Macharia Munene, professor da Universidade Internacional dos EUA, em Nairóbi. “Se a maconha for legalizada no Quênia, a região pode começar a discutir isso seriamente.”

Na África, meia dúzia de países – primeiro Lesoto, em 2017, e recentemente Marrocos, no ano passado – legalizaram a maconha para fins médicos e comerciais, mas não para uso recreativo. Na África do Sul, adultos podem portar, cultivar e consumir privadamente, mas não em público.

Para Wajackoyah, a criminalização é um valor ocidental imposto ao Quênia. A legalização, afirma ele, ajudaria o país a romper com o passado colonial e pagar uma dívida de US$ 71 bilhões. Mas, para especialistas, os cálculos são exagerados. Jeffrey Miron, economista da Universidade Harvard, estima que a renda anual criada para o Quênia seria de US$ 60 milhões.

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APOIO. As declarações de Wajackoyah parecem disparates – ele também fala em exportar testículos de hienas e carne de cachorro –, mas sua proposta inflamou a discussão, segundo o senador Ledama Olekina, que também defende a legalização. “Os expatriados que vivem em Nairóbi fumam maconha”, disse o senador. “Por que os pobres não podem?”

A sociedade queniana ainda é conservadora e religiosa demais para a candidatura de Wajackoyah, mas Olekina está confiante de que, no futuro, a maré pode mudar. “A maconha será legalizada no Quênia”, afirmou. “Só precisamos de mais malucos como Wacjackoyah.”

Apesar do discurso, Wajackoyah diz que não fuma. O foco dele é o cânhamo industrial e o uso medicinal. No entanto, ele não vê problema nenhum no uso recreativo. “O que há de errado? Nossos avós já fumavam maconha.” Ele promete que, se vencer, fumará o primeiro baseado de sua vida dentro do gabinete presidencial.

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2022-08-04T07:00:00.0000000Z

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