O Estado de S. Paulo

Há cinco maneiras para demonstrar amor. Qual é a sua?

Livro mostra que nem sempre compreendemos a maneira como o outro mostra seu afeto, o que pode acarretar decepção

ANA LOURENÇO

Não existe nada mais universal do que o amor, mas será que sua forma de demonstrar também pode ser entendida por todos? No final dos anos 1990, o pastor e conselheiro matrimonial Gary Chapman lançou o livro As 5 Linguagens do Amor explicando que nem todo mundo mostra seu afeto da mesma forma. No começo, a obra foi entendida como mais uma da lista de autoajuda. Anos depois, traduzida para mais de 50 idiomas e com mais de 10 milhões de cópias vendidas pelo mundo, seu sucesso é inegável.

Segundo Chapman, cada indivíduo nasce com uma maneira específica de identificar, receber e dar amor. Normalmente, essa linguagem primária está relacionada a nossa infância e como nossos responsáveis demonstravam amor.

Elas são divididas em cinco grandes grupos: palavras de afirmação, atos de serviço, tempo de qualidade, presentes e toque físico. Os entrevistados procurados pela reportagem foram categóricos em afirmar que essas não são as únicas, porém, são grandes generalizações que ajudam o outro a entender que nem sempre a sua maneira de dar afeto é igual à do outro.

“O livro propõe uma conscientização da forma como o outro espera ser atendido na relação”, sintetiza a terapeuta de relacionamentos Cris Monteiro. “O sentimento tem uma ligação com três pilares que o sustentam: interesse, admiração e merecimento. Então nos interessamos uns pelos outros – com expectativas, interesses – e quando isso é atendido, ou seja nossa linguagem é entendida, imediatamente admiramos o outro. Quando admirados, a gente também se doa e atende o outro.”

“Você é incrível”, “Vai tudo dar certo no trabalho”, “Adoro quando você faz isso”. Elogios, declarações e incentivos são sempre gostosos de escutar. Mas para pessoas que têm palavras de afirmação como sua linguagem do amor, essa escuta é mais valorizada. Assim como os abraços, cafunés e massagens são muito mais do que um carinho espontâneo para aqueles que levam o toque físico como linguagem primária. E o mesmo se dá com os que preferem os presentes. Diferentemente do que pensam, nessa linguagem o que menos importa é o valor financeiro, mas sim o simbolismo do gesto.

‘TANQUE EMOCIONAL’. Quando gostamos de alguém, esses atos surgem naturalmente. No entanto, segundo o autor, cada um de nós tem um “tanque emocional” que, quando vazio, permite que o relacionamento se desgaste, aumentando decepções, brigas e inseguranças. A forma de encher esse tanque seria falando a linguagem certa de maneira genuína.

As outras duas linguagens do amor já são mais específicas – porém, não menos importantes e necessárias em qualquer relacionamento. O tempo de qualidade talvez seja o fator de maior importância nos dias atuais. Essas pessoas sentem necessidade de um tempo dedicado exclusivamente a elas, com conversas, passeios e encontros. Nada de divisão de atenção com o celular, por exemplo. Já os atos de serviço pedem por ajudinhas no dia a dia, como lavar a louça, cozinhar seu prato favorito, arrumar a cama ou trocar a fralda do bebê.

Nem sempre a maneira como você gosta de receber amor é a mesma de seu par. Esse foi um dos maiores aprendizados de André, de 57 anos, e Mônica Martim, de 53, casados há 32 anos. “Intuitivamente a gente pressupõe que a pessoa tem a mesma linguagem de amor que nós temos. Então a gente acaba se esforçando para corresponder o amor da pessoa em uma linguagem que não é a dela. Isso acaba gerando uma frustração em ambas as partes, porque a pessoa não se sente amada na devida proporção e aquele que entrega também se frustra quando não vê resultado”, conta André.

Mônica lembra que a leitura do livro trouxe um novo olhar para o relacionamento dos dois. “Quando você vê realmente que cada um é um, e cada um tem um jeito de reagir às emoções, facilita muito”, diz ela, que demonstra amor com comidinhas caseiras e arrumações da casa. Já André se encanta ao ouvir palavras de afirmação, mas não dispensa um tempo de qualidade com a família. E desde que está com Mônica ele se esforça em fazer tarefas domésticas. “Eu fico imaginando o sorriso dela quando ela vir aquilo. Isso me move”, garante.

A linguagem primária pode e deve ser modificada com o tempo. Experiências positivas e negativas podem exercer influência, mas sempre é bom valorizar outras demonstrações de amor ao longo da vida. “O passado pode comprometer a qualidade da nossa vivência hoje.

DAR TEMPO. O ideal é dar tempo ao tempo e experimentar o que o outro tem a oferecer, consciente dessas diferenças. E ainda adequar o comportamento à realidade atual e não apegada a uma realidade do passado ou a uma cultura original”, ensina Cris.

É importante que essa “ferramenta de autoconhecimento” sirva para facilitar as relações e não para colocá-las em algo imutável. “O autor teve uma sacada muito legal e pode te dar um caminho, uma luz. Agora, se você levar isso como um dogma, pode trazer mais malefícios do que benefícios”, alerta a psicóloga Cláudia Macedo. “A grande sacada dele é falar ‘observe’. Falar ‘eu te amo’ com um espelho na frente não adianta. Quando eu for me declarar, tenho de estar olhando para o outro, na condição dele e perceber como ele gosta.”

No caso de André e Mônica, a reflexão sobre os jeitos de demonstrar amor repercutiu ainda nas filhas do casal, Isabella e Manoela, que também leram o livro. “Para elas é muito importante o tempo de qualidade, e a gente sempre fazia questão de deixar os domingos livres para estarmos todos juntos. E nisso o livro também nos ajudou”, relata ainda Mônica.

Apesar de o título ser dedicado a casais, a compreensão das formas de amor é interessante para qualquer relação. O próprio autor percebeu isso quando optou por lançar, nos anos seguintes, versões destinadas a adolescentes, crianças e até um específico para homens.

“A gente não tem educação afetiva. Ninguém tem, na verdade, mas os homens são ensinados a apagar isso. E geralmente a raiva é o único sentimento permitido, identificado. Há também a questão da fragilidade, porque o perdão é assumir seus erros, é falar sobre isso. E os homens têm essa dificuldade de se mostrar vulneráveis”, revela o estudante e produtor de conteúdo de psicologia das masculinidades João Marques. Para ele, o livro ajuda as pessoas a ter um movimento de olhar e escuta para o outro. “Não costumamos ter esse tipo de conversa e acho que isso é um começo interessante de algo bom.”

Reflexão Além do casal André e Mônica, leitura da obra também influenciou suas duas filhas

LINGUAGENS. Atualmente, o público jovem continua a popularização das cinco linguagens do amor graças aos testes na internet. Aqui você pode fazer o oficial, em inglês: 5lovelanguages.com/quizzes/love-language.

“À medida que a intimidade vai aumentando com uma pessoa, seja amigo, família, você pode perguntar: o que é realmente importante para você? E isso facilita muito a forma certa de você manifestar esse carinho. Hoje, esse tipo de pergunta não é tão mais incomum”, diz Mônica. “Quando você ama a pessoa, você quer fazê-la feliz. O resto é consequência. Você aprende pela outra”, conclui o marido. •

BEM-ESTAR

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2022-04-16T07:00:00.0000000Z

2022-04-16T07:00:00.0000000Z

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