O Estado de S. Paulo

Castillo toma posse no Peru e promete nova Constituição

Em discurso, presidente de esquerda diz que combaterá a corrupção e, para acalmar empresários, afasta possibilidade de estatizações

Prometendo enviar um projeto de lei ao Congresso para viabilizar uma nova Assembleia Constituinte, Pedro Castillo tomou posse ontem como presidente do Peru. O professor rural, que nunca ocupou um cargo político antes, prestou juramento menos de duas semanas depois de ser declarado o vencedor do segundo turno realizado em 6 de junho. Ele é o primeiro presidente de origem camponesa do Peru.

O líder de esquerda substitui Francisco Sagasti no cargo – no qual deve permanecer até 2026 – após um processo eleitoral apertado, no qual a oposição defendeu a tese de fraude eleitoral até o último momento.

Em seu primeiro discurso, Castillo apresentou as linhas gerais de seu governo, que incluem o combate à corrupção. Ele citou o caso da Lava Jato, que teve ramificações graves no Peru, envolvendo ex-presidentes e provocando uma séria instabilidade política. Falou também sobre o combate da pandemia da covid-19, citando o desejo de criar um sistema público e universal de saúde no país. O destaque, no entanto, ficou por conta do anúncio de que enviará ao Congresso um projeto de lei para reformar a Constituição peruana, promulgada em 1993, quando o presidente era o ex-ditador Alberto Fujimori.

Segundo Castillo, o Peru não pode continuar prisioneiro de uma Constituição de 1993. “Insistiremos nessa proposta, mas dentro do marco legal que a Constituição permite. Teremos de conciliar posições com o Congresso”, indicou o novo presidente, cujo partido conquistou apenas 37 das 130 cadeiras do Parlamento.

Acusado durante a campanha por políticos de centro e de direita de representar um risco para as liberdades civil e econômica do país, Castillo destacou que não vai executar nenhum plano de estatização de atividades produtivas, defendendo um modelo que chamou de rentabilidade social nos investimentos privados. “Não pretendemos, nem remotamente, estatizar nenhuma economia, nem fazer uma política de controle de câmbios”, disse.

O presidente afirmou serem totalmente falsas as denúncias feitas por seus opositores de que esteja planejando expropriar poupanças, casas, automóveis, fábricas. “Não faremos nada disso, queremos que a economia mantenha a ordem e a previsibilidade, que é a base das decisões de investimento”, disse, acrescentando que o que defende é o fim dos monopólios e consórcios que cobram valores artificialmente altos por bens e serviços básicos, como o gás de cozinha.

Castillo tomou posse em cerimônia no Congresso Nacional, em Lima, na presença de parlamentares peruanos e autoridades internacionais, como o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, os presidentes Iván Duque (Colômbia) e Sebastián Piñera (Chile) e o rei Felipe VI (Espanha).

O presidente usava um tradicional chapéu de palha de aba larga e um terno com motivos indígenas no momento do juramento. Ele recebeu a faixa presidencial das mãos da presidente do Congresso, Maria del Carmen Alva. Também tomou posse a vice-presidente Dina Boluarte, primeira mulher a ser eleita para o cargo no país.

Castillo também anunciou que pretende criar dois ministérios: o das Culturas – ele destacou o plural, uma vez que o Peru reúne uma grande diversidade cultural – e o da Ciência e Tecnologia. Além disso, afirmou que não vai governar da Palácio Pizarro, sede do governo peruano, e retomará seu trabalho como docente no fim de seu mandato. “Não governarei na Casa de Pizarro, porque acredito que temos de romper com os símbolos coloniais. Cederemos este Palácio ao novo Ministério das Culturas para que seja usado como um museu que mostre a nossa história”, disse, sem esclarecer onde será a sede do seu governo.

Momento crítico. Castillo assume a presidência em um momento crítico para o Peru, no qual o país sofre os efeitos da pandemia de covid-19 e vive uma profunda polarização política. O professor da região de Cajamarca, de 51 anos, assume o comando do país com a maior mortalidade per capita por covid-19 e cuja economia luta para se recuperar após a retração de 11,8% em 2020.

Sua vitória foi uma surpresa para muitos peruanos e, sobretudo, representou um duro golpe para a política tradicional no país. As alegações de fraude feitas por sua adversária Keiko Fujimori não se comprovaram para a Justiça peruana nem para a comunidade internacional, mas atrasaram a proclamação de Castillo em um mês e meio, após a análise de mais de mil ações e recursos legais.

O Peru, que também comemora 200 anos de independência, tem pela primeira vez um chefe de Estado que não é procedente de suas elites políticas e centros de poder.

“Queremos que a economia mantenha a ordem e a previsibilidade, que é a base das decisões de investimento”

Pedro Castillo PRESIDENTE DO PERU

Internacional

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2021-07-29T07:00:00.0000000Z

2021-07-29T07:00:00.0000000Z

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