O Estado de S. Paulo

A FORÇA DE UMA CANÇÃO

Imortalizada por Billie Holiday, ‘Strange Fruit’ tornou-se um hino contra linchamentos que ainda continua atual

Bryan Pietsch / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Quando Billie Holiday cantou Strange Fruit pela primeira vez, em 1939, a música era tão audaciosa para sua época que ela a apresentou em apenas alguns lugares que eram considerados seguros para isso.

A música compara os corpos linchados de negros ao “estranho fruto dos álamos”.

Ahmet Ertegun, o lendário executivo de música exortou a canção como “uma declaração de guerra” e “o início do movimento pelos direitos civis”.

Strange Fruit recebeu nova atenção desde que Andra Day foi indicada para o Oscar de melhor atriz pela sua interpretação da cantora no filme Os Estados Unidos versus Billie Holiday. Dirigido por Lee Daniels, o filme, que está disponível na plataforma Amazon Prime Video, relata a posição de desafio de Billie face aos esforços do governo para suprimir a música.

Billie popularizou a música, levando muita gente a acreditar que ela era responsável pela letra perturbadora, uma ideia reforçada no filme de 1972, Lady Sings the Blues, de Sidney J. Furie, que sugere que ela, interpretada por Diana Ross, compôs a música depois de presenciar um linchamento.

Na verdade, ela foi composta por Abel Meeropol, um professor judeu branco do Bronx.

Abel compôs Strange Fruit ao ver uma foto do linchamento de Thomas Ship e Abram Smith em Marion, Indiana, em 1930. A foto tirada por Lawrence Beitler mostra dois corpos pendurados em uma árvore com uma multidão de brancos olhando, alguns sorrindo. Milhares de cópias da fotografia foram impressas e vendidas, segundo a National Public Radio.

Abel Meeropol, usando o pseudônimo Lewis Allen, não compôs a música para Billie Holiday. A letra foi publicada pela primeira vez como um poema na revista do sindicato dos professores de Nova York, em 1937.

Abel era conhecido por suas ideias comunistas e por ter adotado os dois filhos de Ethel e Julius Rosenberg, acusados e executados por espionagem. A mulher do professor, Anne, cantou Strange Fruit, como também outras cantoras, antes de Billie a apresentar no Café Society, uma boate de Nova York integrada, que recebia brancos e negros, em 1939.

Na época, a mensagem da música – com frases como “cena bucólica do Sul valente, os olhos saltados e a boca retorcida” – era extremamente controvertida.

Mas em 2021, a nação continua seu acerto de contas no caso de uma série de assassinatos de negros desarmados por policiais, com frequência vistos em fotos de negros sendo mortos ou, como no caso de George Floyd, sufocados com o joelho de um policial branco apertando sua garganta. Strange Fruit manteve o seu lugar nos debates nacionais sobre o racismo.

A música “será relevante até a polícia começar a ser condenada pelo assassinato de negros”, disse Michael Meeropol, um dos filhos de Abel, no programa This Morning , da CBS, antes da sentença que condenou Derek Chauvin pela morte da Floyd.

“Quando isso ocorrer, talvez então Strange Fruit se torne uma relíquia de um passado bestial”, afirmou ele. “Mas até então, ela é um espelho de um presente bestial.”

Especial

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2021-05-09T07:00:00.0000000Z

2021-05-09T07:00:00.0000000Z

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